Atresia Duodenal
Resumo
1. Definição e Contexto
A atresia duodenal é uma obstrução congênita completa da luz do duodeno, resultante de falha na recanalização embrionária (8ª-10ª semana). É uma das causas mais comuns de obstrução intestinal alta em RN (1:5.000-10.000 nascidos vivos).
Associações Críticas:
Trissomia do 21 (Síndrome de Down): Presente em 20-30% dos casos.
Outras anomalias congênitas: Cardiopatias, malformações renais, pâncreas anular, má rotação intestinal.
2. Apresentação Clínica (Primeiras 24-48h de Vida)
Vômitos biliosos: Sinal cardinal, ocorre após as primeiras mamadas.
Distensão abdominal epigástrica: Abdômen superior distendido, inferior escavado.
Ausência ou eliminação mínima de mecônio.
Dificuldades alimentares, icterícia.
3. Diagnóstico
Pré-natal (USG após 24 semanas):
Sinal da "dupla bolha": Estômago e duodeno proximal dilatados.
Polidrâmnio: Em ~50% dos casos.
Pós-natal (Radiografia simples de abdômen):
Sinal clássico da "dupla bolha" (estômago + duodeno proximal).
Ausência ou escassez de gás no restante do intestino.
Diagnóstico Diferencial CRÍTICO:
Má rotação intestinal com vólvulo de intestino médio: Emergência cirúrgica! A presença de algum gás distal à "dupla bolha" pode sugerir esta condição ou estenose duodenal.
4. Manejo Pré-Operatório Imediato (Estabilização)
Regime de NPO (Nada por Via Oral).
Posicionamento: Decúbito elevado (30-45°) para prevenir aspiração.
Descompressão Gástrica:
Inserir Sonda Orogástrica (SOG) ou Nasogástrica (SNG) 8-10Fr.
Manter aberta em aspiração contínua ou intermitente de baixa pressão.
Monitorar volume e aspecto do débito.
Hidratação e Correção Eletrolítica:
Acesso venoso calibroso.
Fluidoterapia de Manutenção (RN a termo): Soro Glicosado 10% + NaCl 3 mEq/100mL + KCl 2 mEq/100mL.
Taxa Hídrica Inicial: 80-100 mL/kg/dia. Ajustar conforme perdas e diurese.
Exames laboratoriais: Eletrólitos (Na, K, Cl), glicemia, gasometria, ureia, creatinina. Corrigir hipovolemia, hipocalemia, alcalose metabólica.
Rastreio de Anomalias Associadas:
Ecocardiograma: Para cardiopatias congênitas.
Ultrassonografia Abdominal: Para anomalias renais e outras.
5. Tratamento Cirúrgico
Procedimento de escolha: Duodenoduodenostomia (anastomose entre duodeno proximal dilatado e distal).
Via aberta (laparotomia) ou laparoscópica.
Inspeção de todo o intestino para descartar outras atresias/estenoses.
6. Cuidados Pós-Operatórios e Prescrições
Dieta e Hidratação:
Manter NPO e SOG/SNG aberta para drenagem.
Hidratação Venosa: SG 10% + NaCl + KCl (ex: 100-120 mL/kg/dia).
Nutrição Parenteral Total (NPT): Iniciar em D1 PO se jejum prolongado (>3-5 dias).
Analgesia (Exemplos):
Dipirona Solução Injetável 500mg/mL: 20 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas, se dor.
Paracetamol Solução Injetável 10mg/mL: 10-15 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas (máx. 60 mg/kg/dia), se dor.
Considerar opioides em UTI Neonatal para dor intensa.
Outras Medicações:
Vitamina K (Fitomenadiona): 1 mg, IM, dose única (se não administrado).
Antibioticoprofilaxia: Conforme protocolo cirúrgico (geralmente suspensa em 24-48h).
Monitoramento: Sinais vitais, balanço hídrico rigoroso, débito da SOG, avaliação abdominal, eletrólitos/gasometria diários.
7. Sinais de Alerta para Atenção Imediata
Vômitos biliosos ou persistentes após início da dieta.
Distensão abdominal progressiva.
Taquicardia, taquipneia ou instabilidade hemodinâmica.
Febre (Tax ≥37,8°C) ou hipotermia (Tax <36,5°C).
Alterações no curativo cirúrgico (hiperemia, secreção, deiscência).
Ausência de eliminação de flatos ou fezes após o período esperado.
8. Critérios para Progressão da Dieta
Sinais de restabelecimento do trânsito intestinal:
Redução significativa do débito da SOG (< 1 mL/kg/h).
Mudança do aspecto do resíduo gástrico para claro/salivar.
Presença de ruídos hidroaéreos e/ou eliminação de flatos/mecônio.
Início da Dieta Enteral:
Iniciar com volumes baixos (ex: 1 mL a cada 3 horas) de leite materno ou fórmula elementar.
Progredir lentamente (ex: aumentar 1-2 mL por mamada a cada 12-24h) conforme tolerância.
9. Prognóstico
Taxa de sobrevida superior a 95% para atresia duodenal isolada.
Mortalidade associada a anomalias graves, especialmente cardiopatias complexas.
Seguimento a longo prazo para monitorar complicações (DRGE, dificuldades alimentares).
Categoria
Cirurgia pediátrica > Atresias e esôfago > Atresia Duodenal
Conduta Completa
1. Definição e Contexto
A atresia duodenal é uma malformação congênita caracterizada pela obstrução completa da luz da primeira porção do intestino delgado (duodeno). Essa condição resulta de uma falha na recanalização do duodeno durante o desenvolvimento embrionário, que ocorre entre a 8ª e a 10ª semana de gestação. É uma das causas mais comuns de obstrução intestinal alta em recém-nascidos, com uma incidência estimada de 1 em 5.000 a 10.000 nascidos vivos.
Aproximadamente 20-30% dos fetos com atresia duodenal possuem Trissomia do 21 (Síndrome de Down). Além disso, está frequentemente associada a outras anomalias congênitas, como cardiopatias, malformações renais e anomalias do trato gastrointestinal, incluindo má rotação intestinal e pâncreas anular.
2. Fisiopatologia
Durante o desenvolvimento fetal normal, o lúmen do duodeno é temporariamente obliterado por células epiteliais e, posteriormente, passa por um processo de recanalização para se tornar um tubo oco. A atresia duodenal ocorre quando há uma falha nesse processo de recanalização. A obstrução impede a passagem do conteúdo gástrico e do líquido amniótico deglutido para o restante do intestino, levando ao acúmulo de fluido no estômago e na porção proximal do duodeno.
3. Fatores de Risco
O principal fator de risco associado é a presença de anomalias cromossômicas, mais notavelmente a Trissomia do 21 (Síndrome de Down). Outros fatores incluem a presença de anomalias congênitas múltiplas. Não há evidências claras que associem a atresia duodenal a fatores ambientais ou ações maternas durante a gestação.
4. Apresentação Clínica
O quadro clínico geralmente se manifesta nas primeiras 24 a 48 horas de vida. Os sinais e sintomas cardinais incluem:
Vômitos biliosos: Ocorrem logo após as primeiras mamadas. A presença de bile indica que a obstrução está localizada distalmente à ampola de Vater.
Distensão abdominal epigástrica: O abdômen superior pode parecer distendido devido ao acúmulo de líquido e gás no estômago e duodeno proximal, enquanto o abdômen inferior é tipicamente escavado.
Ausência de evacuações: O recém-nascido pode não eliminar mecônio ou apresentar uma eliminação mínima.
Dificuldades alimentares: Recusa alimentar e baixo ganho ponderal são comuns.
Icterícia: Pode estar presente devido ao aumento da circulação entero-hepática.
5. Diagnóstico
5.1. Diagnóstico Pré-natal
A suspeita diagnóstica pode ser levantada durante a ultrassonografia pré-natal, geralmente após 24 semanas de gestação. Os achados sugestivos são:
Sinal da "dupla bolha": Imagem de duas estruturas anecóicas (bolhas) adjacentes no abdômen fetal, correspondendo ao estômago e ao duodeno proximal dilatados.
Polidrâmnio: Acúmulo excessivo de líquido amniótico, presente em cerca de 50% dos casos, resultante da incapacidade do feto de deglutir e absorver o líquido.
5.2. Diagnóstico Pós-natal
A confirmação diagnóstica no período pós-natal é realizada por meio de exames de imagem:
Radiografia simples de abdômen: É o exame de escolha e revela o clássico sinal da "dupla bolha", com uma bolha de ar representando o estômago e a outra, o duodeno proximal. Caracteristicamente, há ausência ou escassez de gás no restante do intestino.
5.3. Diagnóstico Diferencial
O principal diagnóstico diferencial a ser considerado é a má rotação intestinal com vólvulo de intestino médio, uma emergência cirúrgica. Outras condições incluem estenose duodenal, pâncreas anular e cisto de colédoco. A presença de algum gás distal à "dupla bolha" pode sugerir uma obstrução incompleta (estenose) ou má rotação com vólvulo.
6. Manejo e Tratamento
O tratamento definitivo para a atresia duodenal é a correção cirúrgica. O manejo deve ser realizado em um centro terciário com disponibilidade de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal e cirurgia pediátrica.
6.1. Manejo Pré-operatório
A estabilização do recém-nascido é crucial antes da cirurgia e inclui:
Descompressão gástrica: Passagem de uma sonda nasogástrica ou orogástrica de calibre adequado para esvaziar o conteúdo gástrico, aliviar a distensão e prevenir aspiração.
Hidratação e correção eletrolítica: Administração de fluidos intravenosos para corrigir a desidratação e os desequilíbrios eletrolíticos (hipocalemia, hipocloremia) que podem ocorrer devido aos vômitos.
Suporte nutricional: Iniciar nutrição parenteral total (NPT) se houver previsão de atraso para o início da alimentação enteral.
Investigação de anomalias associadas: Realização de ecocardiograma e ultrassonografia abdominal para rastrear cardiopatias e outras malformações.
6.2. Tratamento Cirúrgico
O procedimento cirúrgico de escolha é a duodenoduodenostomia, que consiste em criar uma anastomose entre o duodeno proximal dilatado e o duodeno distal, "desviando" da área atrésica. A cirurgia pode ser realizada por via aberta (laparotomia) ou laparoscópica. Durante o procedimento, o cirurgião deve inspecionar todo o intestino para descartar outras áreas de atresia ou estenose.
6.3. Cuidados Pós-operatórios
Manutenção da sonda gástrica: A sonda é mantida para descompressão até que o trânsito intestinal seja restabelecido, evidenciado pela diminuição do débito e mudança no aspecto do aspirado.
Suporte hidroeletrolítico e nutricional: Manter a hidratação venosa e a NPT até que a alimentação enteral seja tolerada.
Início da alimentação enteral: A dieta é introduzida de forma gradual assim que houver sinais de função intestinal, geralmente iniciando com volumes pequenos e progressão lenta conforme a tolerância.
7. Complicações
As complicações podem ocorrer no pós-operatório imediato ou tardiamente.
Vazamento da anastomose
Megaduodeno: Dilatação persistente do duodeno proximal, que pode levar a estase e dismotilidade.
Síndrome da alça cega
´Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)
Obstrução intestinal por aderências
Pancreatite e colecistite
8. Prognóstico e Seguimento
Com o diagnóstico precoce e o manejo adequado, a taxa de sobrevida para a atresia duodenal isolada é superior a 95%. O prognóstico a longo prazo é geralmente excelente, com a maioria das crianças atingindo crescimento e desenvolvimento normais. O seguimento a longo prazo é necessário para monitorar e manejar possíveis complicações tardias, como a DRGE e dificuldades alimentares. A mortalidade está frequentemente associada à presença de anomalias graves, especialmente cardiopatias complexas.
9. Referências
1. SIGMON, D. F.; EOVALDI, B. J.; COHEN, H. L. Duodenal Atresia and Stenosis. StatPearls Publishing, 2022.
2. SILVA, V. L. N. et al. Atresia Duodenal: Desafios no Diagnóstico Precoce e Manejo Terapêutico em Recém-Nascidos. Brazilian Journal of One Health, v. 2, n. 2, p. 617-626, 2025.
3. MSD MANUALS. Obstrução duodenal. MSD Manuals Professional Version, 2023.
4. MEDICOVER HOSPITALS. Duodenal Atresia: Causes, Symptoms, and Treatment. Medicover Hospitals, 2025.
5. RODRIGUES, W. P. Atresia duodenal (dupla bolha) – desenvolvimento e aplicação de cuidados: estudo de caso. Revista Saúde em Foco, ed. 10, 2018.
6. FETALMED. Atresia Duodenal. Fetalmed*, 2020.
Tratamento
1. Orientações ao Prescritor
Este guia destina-se ao manejo inicial e pós-operatório de recém-nascidos com diagnóstico de atresia duodenal. As condutas devem ser realizadas em ambiente hospitalar com suporte de UTI neonatal e cirurgia pediátrica. A estabilização clínica pré-operatória é prioritária.
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2. Manejo Pré-Operatório Imediato (Estabilização)
Medidas Gerais
Regime de NPO (Nada por Via Oral): Suspender completamente a alimentação enteral.
Posicionamento: Decúbito elevado a 30-45° para reduzir o risco de aspiração.
Monitoramento Contínuo: Frequência cardíaca, frequência respiratória, saturação de oxigênio (SpO2) e pressão arterial.
Descompressão Gástrica
Sonda Orogástrica (SOG) ou Nasogástrica (SNG): Inserir sonda de calibre 8Fr ou 10Fr.
Modo de Drenagem: Deixar aberta e em aspiração contínua ou intermitente de baixa pressão para esvaziar o estômago e o duodeno proximal.
Monitorar: Volume e aspecto do débito drenado.
Hidratação e Correção Eletrolítica
Acesso Venoso Periférico: Obter acesso calibroso.
Fluidoterapia de Manutenção (RN a termo):
- Solução: Soro Glicosado 10% + Sódio (NaCl 20%) 3 mEq/100mL + Potássio (KCl 19,1%) 2 mEq/100mL.
- Taxa Hídrica Inicial: 80-100 mL/kg/dia. Ajustar conforme diurese, perdas e estado de hidratação.
Correção de Distúrbios Hidroeletrolíticos:
- Coletar exames laboratoriais: eletrólitos (Na, K, Cl), glicemia, gasometria venosa, ureia e creatinina.
- Corrigir hipovolemia, hipocalemia e alcalose metabólica hipoclorêmica conforme protocolos institucionais.
Rastreio de Anomalias Associadas
Solicitar Ecocardiograma: Avaliação de cardiopatias congênitas.
Solicitar Ultrassonografia Abdominal: Avaliação de anomalias renais e outras malformações.
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3. Prescrição Pós-Operatória (Exemplo)
Dieta e Hidratação
1. Manter NPO até segunda ordem.
2. Sonda Orogástrica/Nasogástrica: Manter aberta para drenagem.
3. Hidratação Venosa:
- Plano Base: Soro Glicosado 10% 500mL + NaCl 20% 15mL + KCl 19,1% 10mL.
- Infusão: Correr [Calcular volume em mL/h com base em 100-120 mL/kg/dia] em bomba de infusão contínua.
4. Nutrição Parenteral Total (NPT): Iniciar em D1 de pós-operatório se previsão de jejum prolongado (> 3-5 dias). Prescrever conforme protocolo da unidade.
Analgesia
Dipirona Solução Injetável 500mg/mL:
- Dose: 20 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas, se dor.
Paracetamol Solução Injetável 10mg/mL:
- Dose: 10-15 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas (máx. 60 mg/kg/dia), se dor.
Considerar opioides (ex: Morfina) em infusão contínua para dor intensa, conforme protocolo da UTI Neonatal.
Outras Medicações
Vitamina K (Fitomenadiona): 1 mg, IM, dose única (se ainda não administrado ao nascer).
Antibioticoprofilaxia: Conforme protocolo do serviço de cirurgia pediátrica (geralmente suspensa após 24-48h se não houver intercorrências infecciosas).
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4. Monitoramento Clínico e Laboratorial
Sinais Vitais: Aferir de 1/1h nas primeiras 6h, depois de 4/4h.
Balanço Hídrico: Rigoroso a cada 12h.
Débito da Sonda Gástrica: Medir e registrar volume e aspecto a cada 4-6h.
Avaliação Abdominal: Inspecionar curativo cirúrgico, avaliar distensão e ruídos hidroaéreos.
Controle Laboratorial: Eletrólitos e gasometria diários ou conforme necessidade clínica.
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5. Sinais de Alerta para Retorno/Atenção Imediata
Vômitos biliosos ou persistentes após o início da dieta.
Distensão abdominal progressiva.
Taquicardia, taquipneia ou instabilidade hemodinâmica.
Febre (Tax ≥37,8°C) ou hipotermia (Tax <36,5°C).
Alterações no curativo cirúrgico: Hiperemia, secreção purulenta ou deiscência.
Ausência de eliminação de flatos ou fezes após o período esperado.
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6. Critérios para Progressão da Dieta
Sinais de restabelecimento do trânsito intestinal:
- Redução significativa do débito pela sonda gástrica (< 1 mL/kg/h).
- Mudança do aspecto do resíduo gástrico para claro ou salivar.
- Presença de ruídos hidroaéreos e/ou eliminação de flatos/mecônio.
Início da Dieta Enteral:
- Iniciar com volumes baixos (ex: 1 mL a cada 3 horas) de leite materno ou fórmula elementar.
- Progredir lentamente (ex: aumentar 1-2 mL por mamada a cada 12-24h) conforme tolerância, monitorando resíduos gástricos e distensão abdominal.
Acesso Interativo
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