Intussuscepção

Resumo

1. Definição e Fisiopatologia A Intussuscepção, ou invaginação intestinal, é a telescopagem de um segmento do intestino (o intussuscepto) para dentro de um segmento adjacente mais distal (o intussuscipiente). É a causa mais comum de obstrução intestinal em crianças entre 6 meses e 3 anos de idade e constitui uma emergência pediátrica. Fisiopatologia A invaginação arrasta o mesentério do segmento proximal, comprimindo os vasos sanguíneos. Inicialmente, a obstrução venosa e linfática causa edema

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Gastrointestinais e Alergias Alimentares > Afecções Cirúrgicas e Anatômicas > Intussuscepção

Conduta Completa

1. Definição e Fisiopatologia A Intussuscepção, ou invaginação intestinal, é a telescopagem de um segmento do intestino (o intussuscepto) para dentro de um segmento adjacente mais distal (o intussuscipiente). É a causa mais comum de obstrução intestinal em crianças entre 6 meses e 3 anos de idade e constitui uma emergência pediátrica. Fisiopatologia A invaginação arrasta o mesentério do segmento proximal, comprimindo os vasos sanguíneos. Inicialmente, a obstrução venosa e linfática causa edema e congestão da parede intestinal. Se não tratada, a compressão arterial leva à isquemia, necrose e eventual perfuração, resultando em peritonite. A mucosa isquêmica e edemaciada produz muco e sangue, que se misturam para formar as clássicas "fezes em geleia de groselha". 2. Etiologia Intussuscepção Idiopática (90-95% dos casos): É a forma mais comum, ocorrendo tipicamente em lactentes saudáveis. Acredita-se que seja causada pela hipertrofia do tecido linfoide (placas de Peyer) na parede do íleo terminal, geralmente após uma infecção viral (adenovírus). Esse tecido linfoide aumentado atua como um "ponto de ancoragem" (lead point) que é tracionado pela peristalse, iniciando a invaginação. A localização mais comum é a ileocólica. Intussuscepção Patológica (5-10%): Ocorre quando há um lead point anatômico identificável. É mais comum em crianças menores de 3 meses ou maiores de 5 anos. As causas incluem Divertículo de Meckel, pólipos intestinais, duplicações intestinais, linfoma ou hematomas (púrpura de Henoch-Schönlein). 3. Avaliação Clínica e Diagnóstico O diagnóstico é baseado na suspeita clínica e confirmado por imagem. Manifestações Clínicas Tríade Clássica (presente em <20% dos casos): Dor Abdominal: O sintoma mais característico. A dor é súbita, intensa, em cólica e intermitente. Durante os episódios, a criança chora de forma inconsolável e flexiona as pernas sobre o abdome. Entre as crises, a criança pode parecer normal ou letárgica. Vômitos: Inicialmente alimentares, podem se tornar biliosos com a progressão da obstrução. Massa Abdominal Palpável: Frequentemente descrita em formato de "salsicha", geralmente localizada no quadrante superior direito do abdome. Outros Sinais Importantes: Letargia: A criança pode apresentar uma prostração desproporcional entre as crises de dor. Fezes em "Geleia de Groselha": Mistura de sangue e muco. É um sinal mais tardio, indicativo de isquemia da mucosa. Diagnóstico por Imagem Ultrassonografia Abdominal: É o método de escolha (padrão-ouro) para o diagnóstico. É rápido, não invasivo e altamente acurado (>98% de sensibilidade). Os achados clássicos são o "sinal do alvo" ou "donut" no corte transversal e o "sinal do pseudorrim" no corte longitudinal. Radiografia Simples de Abdome: Não é útil para diagnosticar a intussuscepção, mas é importante para descartar complicações, como sinais de obstrução intestinal de delgado ou, crucialmente, a presença de pneumoperitônio, que indica perfuração e é uma contraindicação absoluta à redução não cirúrgica. 4. Manejo e Tratamento A intussuscepção é uma emergência. O tratamento visa a redução da invaginação. Estabilização Inicial Todo paciente com suspeita de intussuscepção deve ser mantido em jejum (NPO), receber acesso venoso e hidratação para corrigir a desidratação e os distúrbios eletrolíticos. Uma sonda nasogástrica pode ser inserida para descompressão gástrica. Redução Não Cirúrgica É o tratamento de primeira linha para pacientes estáveis, sem sinais de peritonite ou perfuração. O objetivo é usar pressão para "empurrar" o segmento invaginado de volta à sua posição original. Métodos: Redução Pneumática (com ar): Preferida em muitos centros por ser mais rápida e ter menor taxa de contaminação peritoneal em caso de perfuração. Redução Hidrostática (com soro fisiológico ou contraste): Alternativa eficaz. Técnica: O procedimento é realizado sob controle de imagem (fluoroscopia ou ultrassonografia) por um radiologista experiente, com a equipe de cirurgia pediátrica ciente e disponível. Taxa de Sucesso: 80 a 95%. Tratamento Cirúrgico Indicações: Falha na tentativa de redução não cirúrgica. Presença de sinais de peritonite, perfuração ou choque (contraindicações à redução não cirúrgica). Identificação de um lead point patológico. Procedimento: A cirurgia, realizada por laparoscopia ou laparotomia, consiste na redução manual ("ordenha") do segmento invaginado. Se houver necrose intestinal, perfuração, ou um lead point que necessite de remoção, a ressecção do segmento acometido com anastomose primária é necessária. 5. Prognóstico e Complicações Prognóstico: Com diagnóstico e tratamento precoces, o prognóstico é excelente. Recorrência: Ocorre em 5 a 10% dos casos após a redução não cirúrgica, geralmente nas primeiras 24-48 horas. Uma nova tentativa de redução não cirúrgica é geralmente bem-sucedida. Esta taxa de recorrência justifica a observação hospitalar por 24 horas após um procedimento bem-sucedido. Complicações: Atrasos no diagnóstico podem levar a necrose intestinal, perfuração, peritonite e sepse, aumentando significativamente a morbimortalidade. Referências Bibliográficas 1. Mandeville, K., Chien, M., & Pyo, J. (2012). Intussusception: a review of the literature. Pediatric Emergency Care, 28(11), 1247-1254. 2. Sociedade Brasileira de Cirurgia Pediátrica (CIPE). (2020). Intussuscepção. Diretrizes. 3. Applegate, K. E. (2009). Intussusception in children: evidence-based diagnosis and treatment. Pediatric Radiology, 39(Suppl 2), S140–S143. 4. Gluckman, S., et al. (2017). Management of intussusception in the pediatric emergency department: a national survey of attending physicians. Pediatric Emergency Care, 33(12), 773-777. 5. Jiang, J., Jiang, B., Parashar, U., et al. (2013). Childhood intussusception: a literature review. PLoS One, 8(7), e68482. 6. Navarro, O., & Daneman, A. (2004). Intussusception. Part 3: diagnosis and management of those with an identifiable or predisposing cause and those that reduce spontaneously. Pediatric Radiology, 34(4), 305–312. 7. Hryhorczuk, A. L., & Strouse, P. J. (2009). Validation of US as a first-line imaging test for diagnosis of pediatric intussusception. Pediatric Radiology, 39(10), 1075-1079.

Tratamento

1. Orientações Gerais ao Prescritor A intussuscepção é uma emergência cirúrgica/radiolôgica. O tempo é crucial. A prioridade é a estabilização hemodinâmica seguida pela confirmação diagnóstica com ultrassom. A redução não cirúrgica é o tratamento de escolha na ausência de contraindicações. A equipe de cirurgia pediátrica deve ser sempre comunicada. 2. Prescrição de Admissão e Estabilização Inicial 1. Admitir em regime de internação hospitalar. 2. Manter em jejum (NPO) absoluto. 3. Obter acesso venoso periférico calibroso e iniciar Hidratação Venosa (HV). Prescrição: Soro Fisiológico 0,9%, 20 mL/kg, IV, em bolus, se sinais de desidratação ou choque. Após, manter com solução glicofisiológica para cobrir as necessidades basais. 4. Instalar Sonda Nasogástrica em aspiração, se houver vômitos biliosos ou distensão abdominal significativa. 5. Coletar exames laboratoriais: Hemograma completo, Eletrólitos, Ureia e Creatinina. 6. Prescrever Analgesia: Dipirona 20 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas. Se dor intensa, prescrever Morfina 0,05 a 0,1 mg/kg/dose, IV, conforme necessidade. 7. Solicitar avaliação da Cirurgia Pediátrica com urgência. 3. Prescrição para Investigação Diagnóstica 1. Solicitar Ultrassonografia de Abdome com pesquisa de intussuscepção, com urgência. 2. Solicitar Radiografia Simples de Abdome (AP e ortostase) para avaliar sinais de obstrução e, principalmente, para descartar pneumoperitônio. 4. Prescrição para Preparo e Realização da Redução Não Cirúrgica Indicação: Paciente estável, sem sinais de peritonite ou perfuração. 1. Encaminhar para o setor de Radiologia para realização de Redução de Intussuscepção por Enema Pneumático (ar) ou Hidrostático (soro fisiológico), guiado por fluoroscopia ou ultrassonografia. 2. Antibioticoprofilaxia: Prescrever Cefazolina 30-50 mg/kg, IV, em dose única, 30 minutos antes do procedimento. 3. Garantir que a equipe de cirurgia pediátrica esteja ciente e disponível durante o procedimento. 5. Prescrição de Cuidados Pós-Redução Bem-Sucedida 1. Manter em observação hospitalar por 24 horas. Esta medida é crucial devido ao risco de recorrência de 5 a 10%, que é mais comum neste período inicial. 2. Manter em jejum (NPO) por 4 a 6 horas após o procedimento. 3. Após 4-6h, se o paciente estiver clinicamente bem (sem dor, abdome flácido), iniciar dieta líquida e progredir para a dieta habitual conforme a aceitação. 4. Manter acesso venoso salinizado. 5. Monitorar e registrar ativamente os sinais de recorrência: retorno da dor em cólica, vômitos ou letargia. 6. Prescrição para Manejo Cirúrgico Indicação: Falha na redução não cirúrgica ou presença de contraindicações. 1. Encaminhar para o centro cirúrgico para Cirurgia para Redução de Intussuscepção (com ressecção intestinal, se necessário). 2. Antibioticoterapia Terapêutica (se houver perfuração ou necrose): * Prescrever esquema de amplo espectro, como Ampicilina/Sulbactam 150 mg/kg/dia, IV, de 6/6h, ou Ceftriaxona + Metronidazol. 3. Cuidados Pós-Operatórios: Seguir prescrição padrão para pós-operatório de cirurgia abdominal, incluindo analgesia, hidratação venosa e progressão da dieta.

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