Osteomielite Aguda
Resumo
1. Definição e Fisiopatologia
A Osteomielite Aguda é uma infecção inflamatória do osso, que envolve o córtex, o periósteo e a medula óssea. Em pediatria, a forma mais comum é a osteomielite hematogênica aguda, que ocorre pela disseminação de bactérias através da corrente sanguínea.
Fisiopatologia: A infecção tipicamente se aloja na metáfise dos ossos longos (fêmur, tíbia, úmero). Esta região é particularmente vulnerável em crianças devido à sua rica vascularização com capilares de fluxo lento (
Categoria
Infecciosas e Exantemáticas > Infecções Bacterianas Sistêmicas > Osteomielite Aguda
Conduta Completa
1. Definição e Fisiopatologia
A Osteomielite Aguda é uma infecção inflamatória do osso, que envolve o córtex, o periósteo e a medula óssea. Em pediatria, a forma mais comum é a osteomielite hematogênica aguda, que ocorre pela disseminação de bactérias através da corrente sanguínea.
Fisiopatologia: A infecção tipicamente se aloja na metáfise dos ossos longos (fêmur, tíbia, úmero). Esta região é particularmente vulnerável em crianças devido à sua rica vascularização com capilares de fluxo lento (sinusoides venosos), que facilitam a deposição de bactérias. A infecção desencadeia uma resposta inflamatória intensa, levando à formação de pus, aumento da pressão intraóssea e comprometimento do suprimento sanguíneo. Isso pode resultar em necrose óssea, com a formação de um fragmento de osso desvitalizado chamado sequestro ósseo. O corpo tenta conter a infecção formando uma camada de osso novo ao redor da área, conhecida como invólucro. Se não tratada, a infecção pode se estender para tecidos moles, formar abscessos subperiosteais ou fistulizar para a pele.
2. Etiologia
O agente etiológico varia com a idade e as condições clínicas do paciente.
Staphylococcus aureus: É o principal agente em todas as faixas etárias, respondendo por até 80% dos casos. A crescente prevalência de cepas resistentes à meticilina (MRSA) impacta a escolha da terapia empírica.
**Streptococcus pyogenes (Grupo A) e S. pneumoniae: * Comuns em crianças maiores.
Kingella kingae: Um agente cada vez mais reconhecido em crianças menores de 4 anos, frequentemente associado a um quadro clínico mais brando.
Neonatos: S. aureus, Streptococcus agalactiae (GBS) e bacilos Gram-negativos (E. coli).
Pacientes com Anemia Falciforme: Salmonella sp. é um agente clássico e deve sempre ser considerado.
3. Avaliação Clínica e Diagnóstico
O diagnóstico é baseado na tríade de suspeita clínica, marcadores inflamatórios e achados de imagem.
Manifestações Clínicas:
Sintomas Locais: Dor óssea intensa, focal e progressiva é o sintoma cardinal. A criança apresenta recusa em mover o membro afetado (pseudoparalisia) e claudicação. Ao exame, há dor à palpação local (ponto de máxima sensibilidade), edema, calor e eritema sobre a área acometida.
Sintomas Sistêmicos: Febre (geralmente alta), irritabilidade, prostração e recusa alimentar.
Diagnóstico Laboratorial:
Marcadores Inflamatórios: Proteína C Reativa (PCR) e Velocidade de Hemossedimentação (VHS) estão quase sempre elevadas e são excelentes para monitorar a resposta ao tratamento.
Hemograma: Pode mostrar leucocitose com desvio à esquerda.
Hemoculturas: Devem ser coletadas em todos os casos antes do início dos antibióticos. São positivas em cerca de 50% dos casos e podem identificar o agente causal.
Diagnóstico por Imagem:
Radiografia Simples: É o exame inicial, mas é insensível na fase aguda. As alterações (reação periosteal, lesões líticas) só se tornam visíveis após 10 a 14 dias. Sua principal função inicial é descartar outros diagnósticos, como fraturas ou tumores.
Ressonância Magnética (RM): É o padrão-ouro para o diagnóstico precoce. Possui alta sensibilidade (>95%) para detectar edema da medula óssea nas primeiras 24-48 horas de infecção. Também é excelente para identificar complicações como abscessos subperiosteais ou em partes moles.
Ultrassonografia: Útil para detectar coleções líquidas adjacentes ao osso (abscesso subperiosteal) e para guiar a punção aspirativa.
Confirmação Microbiológica: A aspiração do osso ou de um abscesso adjacente, guiada por imagem, para cultura e antibiograma é indicada em pacientes gravemente enfermos ou que não respondem à terapia empírica inicial.
4. Manejo e Tratamento
A osteomielite é uma emergência ortopédica que requer hospitalização e tratamento agressivo.
Antibioticoterapia:
É o pilar do tratamento e deve ser iniciada empiricamente assim que as culturas forem coletadas.
A escolha inicial deve ter boa cobertura para S. aureus.
Primeira Escolha (em áreas com baixa prevalência de MRSA): Uma penicilina resistente à penicilinase (Oxacilina) ou uma cefalosporina de 1ª geração (Cefazolina).
Se alta prevalência de MRSA comunitário ou paciente grave: Clindamicina ou Vancomicina devem ser associadas ou usadas como primeira linha.
A terapia é iniciada por via endovenosa. A transição para a via oral é possível após melhora clínica e laboratorial (queda da febre e da PCR).
Duração Total: O tratamento é prolongado, classicamente de 4 a 6 semanas.
Tratamento Cirúrgico:
A cirurgia é indicada para drenagem de abscessos subperiosteais ou intraósseos, ou para desbridamento de osso necrótico (sequestro) em casos crônicos. A falha na melhora clínica após 48-72 horas de antibioticoterapia adequada é uma forte indicação para a intervenção cirúrgica.
5. Complicações e Prognóstico
Complicações: Se não tratada adequadamente, a osteomielite aguda pode evoluir para osteomielite crônica, artrite séptica (por extensão para a articulação), fraturas patológicas e distúrbios do crescimento do membro afetado.
Prognóstico: Com diagnóstico e tratamento precoces e adequados, o prognóstico é excelente, com cura sem sequelas em mais de 90% dos casos.
Referências Bibliográficas
Peltola, H., & Pääkkönen, M. (2014). Acute osteomyelitis in children. The New England Journal of Medicine, 370(4), 352–360. (Artigo de revisão fundamental do NEJM).
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Krogstad, P. (2023). Hematogenous osteomyelitis in children: Evaluation and diagnosis. In UpToDate.
Saavedra-Lozano, J., et al. (2008). Changing trends in acute osteomyelitis in children: impact of methicillin-resistant Staphylococcus aureus infections. Journal of Pediatric Orthopaedics, 28(5), 569–575.
Copley, L. A., et al. (2013). The impact of evidence-based clinical practice guidelines applied by a multidisciplinary team for the care of children with osteomyelitis. The Journal of Bone and Joint Surgery. American volume, 95*(8), 686–693.
Tratamento
1. Orientações Gerais ao Prescritor
A osteomielite aguda é uma emergência ortopédica e infecciosa. A hospitalização para antibioticoterapia endovenosa é mandatória.
A escolha do antibiótico empírico deve considerar a faixa etária e a prevalência local de MRSA.
A analgesia adequada é um componente crucial do tratamento.
O tratamento é prolongado (4-6 semanas) e a transição da via IV para a oral depende de critérios clínicos e laboratoriais.
2. Prescrição de Admissão e Investigação Inicial
1. Admitir em Unidade de Internação Pediátrica.
2. Manter em repouso no leito com imobilização do membro afetado em posição funcional e confortável.
3. Manter em jejum (NPO) até avaliação da necessidade de abordagem cirúrgica.
4. Obter acesso venoso periférico.
5. Coletar exames de urgência: 2 amostras de Hemocultura de sítios diferentes, Hemograma completo, VHS e PCR.
6. Solicitar exames de imagem: Radiografia do membro afetado e, se disponível, Ressonância Magnética com contraste da região acometida.
7. Solicitar avaliação da Ortopedia Pediátrica.
3. Prescrição de Antibioticoterapia Empírica Endovenosa
Crianças > 3 meses (em locais com baixa prevalência de MRSA)
Prescrição (Primeira Escolha):
1. Oxacilina 150 a 200 mg/kg/dia, IV, dividida de 6 em 6 horas.
Prescrição (Alternativa):
1. Cefazolina 100 a 150 mg/kg/dia, IV, dividida de 8 em 8 horas.
Crianças > 3 meses (em locais com alta prevalência de MRSA ou paciente grave/séptico)
Prescrição (Primeira Escolha):
1. Clindamicina 40 mg/kg/dia, IV, dividida de 8 em 8 horas.
Prescrição (Alternativa ou se Clindamicina não for opção):
1. Vancomicina 60 mg/kg/dia, IV, dividida de 6 em 6 horas. Prescrever monitoramento de nível sérico para manter vale entre 10-15 mcg/mL.
Neonatos (< 3 meses)
Prescrição:
1. Oxacilina na dose para a idade.
2. Associar: Cefotaxima 150 mg/kg/dia, IV, dividida de 8 em 8 horas.
4. Prescrição para Controle da Dor
1. Dipirona 20 mg/kg/dose, IV, a cada 6 horas, de forma regrada nas primeiras 48h.
2. Se dor intensa e refratária, prescrever Morfina 0,05 a 0,1 mg/kg/dose, IV, a cada 4 horas, conforme necessidade.
5. Critérios e Prescrição para Transição para Terapia Oral
Critérios: Paciente com melhora clínica significativa, afebril há pelo menos 48-72 horas, com queda acentuada da PCR e capaz de tolerar medicação oral.
Prescrição (após 1-3 semanas de terapia IV, dependendo da gravidade):
1. Suspender antibioticoterapia endovenosa.
2. Prescrever antibiótico oral com boa biodisponibilidade, guiado pelo antibiograma, se disponível.
* Opções comuns: Clindamicina (30 mg/kg/dia), Cefalexina (100-150 mg/kg/dia), Linezolida (30 mg/kg/dia).
3. Manter a terapia oral para completar um tempo total de tratamento de 4 a 6 semanas (IV + VO).
6. Orientações de Alta e Seguimento
1. Agendar retorno com o Ortopedista Pediátrico em 1 semana após a alta.
2. Manter o membro em repouso relativo, com carga parcial progressiva conforme orientação.
3. Orientar a família sobre a importância de completar todo o ciclo de antibióticos.
4. Fornecer receita para analgesia, se necessário.
5. Agendar coleta de PCR e VHS semanalmente até a normalização.
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