Malária
Resumo
1. Definição e Fisiopatologia
A Malária é uma doença infecciosa febril aguda, causada por protozoários do gênero Plasmodium, transmitida ao ser humano pela picada de fêmeas infectadas do mosquito Anopheles. No Brasil, a transmissão ocorre quase exclusivamente na Região Amazônica, com duas espécies principais de importância epidemiológica:
Plasmodium vivax: Responsável pela maioria dos casos (cerca de 85%), geralmente causa doença benigna, mas tem a capacidade de formar hipnozoítos (formas lat
Categoria
Infecciosas e Exantemáticas > Outras infecções > Malária
Conduta Completa
1. Definição e Fisiopatologia
A Malária é uma doença infecciosa febril aguda, causada por protozoários do gênero Plasmodium, transmitida ao ser humano pela picada de fêmeas infectadas do mosquito Anopheles. No Brasil, a transmissão ocorre quase exclusivamente na Região Amazônica, com duas espécies principais de importância epidemiológica:
Plasmodium vivax: Responsável pela maioria dos casos (cerca de 85%), geralmente causa doença benigna, mas tem a capacidade de formar hipnozoítos (formas latentes no fígado) que causam recaídas tardias.
Plasmodium falciparum: Menos comum (cerca de 15%), mas é o agente da malária grave, com alta letalidade se não tratada.
Fisiopatologia
Após a picada do mosquito, os esporozoítos infectam os hepatócitos (ciclo hepático). Após a maturação, os merozoítos são liberados na corrente sanguínea e invadem as hemácias (ciclo eritrocítico). A lise sincrônica das hemácias para liberar novos merozoítos é responsável pelos picos febris característicos (paroxismos).
A gravidade da malária por P. falciparum decorre de sua capacidade de fazer com que as hemácias infectadas adiram ao endotélio de pequenos vasos sanguíneos (citoaderência), causando sequestro microvascular e obstrução do fluxo sanguíneo em órgãos vitais, principalmente no cérebro (malária cerebral), pulmões e rins.
2. Avaliação Clínica e Diagnóstico
Manifestações Clínicas (Malária Não Complicada)
A apresentação clássica é o paroxismo malárico, um ciclo de febre que ocorre a cada 48 horas (febre terçã para P. vivax e P. falciparum) ou 72 horas (febre quartã para P. malariae). O paroxismo tem três fases:
1. Fase Fria: Calafrios intensos e tremores (dura 15-60 min).
2. Fase Quente: Febre alta (39-41°C), cefaleia, mialgia (dura 2-6 h).
3. Fase de Sudorese: Sudorese profusa, com defervescência da febre e sensação de alívio.
Outros achados comuns são anemia, cefaleia e hepatoesplenomegalia.
Sinais de Gravidade (Critérios para Malária Complicada)
A presença de qualquer um dos seguintes sinais define um caso como malária grave e exige hospitalização imediata em UTI:
Alteração da Consciência / Coma (Malária Cerebral).
Convulsões repetidas (>2 em 24h).
Prostração extrema.
Insuficiência respiratória / Edema pulmonar.
Choque circulatório ou hipotensão.
Sangramento anormal (CIVD).
Icterícia associada à disfunção de outro órgão.
Anemia Grave (Hb < 5 g/dL em crianças).
Hipoglicemia (< 40 mg/dL).
Insuficiência renal aguda (oligúria).
Acidose metabólica grave.
Hiperparasitemia (>10% em não imunes).
Diagnóstico Laboratorial
Gota Espessa de Sangue: É o padrão-ouro. Permite não apenas a detecção do parasita, mas também a diferenciação da espécie (fundamental para o tratamento) e a quantificação da parasitemia (cruzes ou parasitas/µL).
Testes Rápidos para Malária: Detectam antígenos do Plasmodium. São úteis para triagem em locais remotos, mas um resultado negativo não exclui o diagnóstico, e a gota espessa é sempre necessária para confirmação e quantificação.
3. Manejo e Tratamento
O tratamento é específico para a espécie do Plasmodium e a gravidade do caso.
Tratamento da Malária por P. vivax (Não Complicada)
O objetivo é eliminar as formas sanguíneas e as formas latentes no fígado (hipnozoítos) para evitar recaídas.
Esquema Padrão:
1. Cloroquina por 3 dias (para as formas sanguíneas).
2. Primaquina por 7 dias (para os hipnozoítos - cura radical).
Atenção: Antes de iniciar a Primaquina, é fundamental verificar se o paciente não tem deficiência de G6PD, pelo risco de hemólise grave.
Tratamento da Malária por P. falciparum (Não Complicada)
O tratamento de escolha são as terapias combinadas baseadas em artemisinina (ACTs).
Esquema Padrão (Brasil): Artemeter + Lumefantrina por 3 dias.
Tratamento da Malária Grave (P. falciparum)
É uma emergência médica que requer hospitalização em UTI.
Droga de Escolha: Artesunato Endovenoso. Deve ser administrado o mais rápido possível.
Medidas de Suporte: Manejo de convulsões, correção da hipoglicemia, suporte ventilatório, transfusão de hemácias para anemia grave e, se necessário, terapia de substituição renal.
4. Prevenção
A prevenção é focada no combate ao vetor e na proteção individual.
Controle Vetorial: Drenagem de criadouros, borrifação intradomiciliar de inseticidas.
Proteção Individual: Uso de mosquiteiros impregnados com inseticida, roupas compridas ao entardecer/amanhecer, e repelentes (DEET 20-50%).
Quimioprofilaxia: Indicada para viajantes que se deslocam para áreas de alta transmissão. A escolha da droga (Doxiciclina, Mefloquina, etc.) depende do padrão de resistência local.
Referências Bibliográficas
1. Ministério da Saúde (Brasil). (2020). Guia de Tratamento da Malária no Brasil.
2. World Health Organization (WHO). (2023). Guidelines for Malaria.
3. American Academy of Pediatrics. Malaria. In: Red Book: 2024 Report of the Committee on Infectious Diseases (33rd ed.).
4. Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). (2019). Malária na Infância.
5. White, N. J., Pukrittayakamee, S., Hien, T. T., et al. (2014). Malaria. The Lancet, 383(9918), 723–735. (Artigo de revisão clássico e fundamental da Lancet).
6. Ashley, E. A., & Phyo, A. P. (2018). Drugs in Development for Malaria. Drugs, 78(9), 861-879.
Tratamento
1. Orientações Gerais ao Prescritor
O tratamento da malária é uma emergência, especialmente se por P. falciparum ou se houver sinais de gravidade.
A *confirmação da espécie do Plasmodium pela gota espessa é fundamental para a escolha do tratamento correto.
Notifique o caso à vigilância epidemiológica. O tratamento é fornecido gratuitamente pelo SUS.
Todo caso de malária por P. falciparum deve ser considerado uma emergência médica e, preferencialmente, tratado em ambiente hospitalar nas primeiras 24-48h.
2. Prescrição para Malária por P. vivax (Não Complicada)
Primeira Etapa (Tratamento das formas sanguíneas)
1. Fosfato de Cloroquina comprimido 150mg (base).
2. Dose Total: 25 mg/kg (de cloroquina base), dividida em 3 dias.
3. Esquema de Administração:
Dia 1: 10 mg/kg.
Dia 2: 7,5 mg/kg.
Dia 3: 7,5 mg/kg.
Segunda Etapa (Cura Radical - tratamento dos hipnozoítos)
1. Fosfato de Primaquina comprimido 5mg ou 15mg (infantil/adulto).
2. Dose: 0,5 mg/kg/dia, por via oral, em dose única diária.
3. Duração: 7 dias.
4. Atenção: Iniciar após o término da cloroquina. Verificar o resultado do teste de G6PD antes de prescrever, se disponível.
3. Prescrição para Malária por P. falciparum (Não Complicada)
1. Artemeter + Lumefantrina, comprimido (20mg + 120mg).
2. Dose: A posologia é baseada em faixas de peso.
5 a <15 kg: 1 comprimido por dose.
15 a <25 kg: 2 comprimidos por dose.
25 a <35 kg: 3 comprimidos por dose.
≥35 kg: 4 comprimidos por dose.
3. Esquema de Administração (Total de 6 doses):
Administrar a primeira dose no tempo 0, a segunda 8 horas após, e depois a cada 12 horas por mais 2 dias (nos tempos 24h, 36h, 48h e 60h).
4. Orientação: Orientar o paciente a tomar os comprimidos junto com uma refeição gordurosa para aumentar a absorção.
4. Prescrição para Malária Grave (Manejo em UTI)
1. Admitir em leito de UTI Pediátrica.
2. Instalar monitorização contínua e obter acesso venoso calibroso.
3. Coletar exames de urgência: Gota espessa, Hemograma, Glicemia, Eletrólitos, Função renal e hepática, Coagulograma, Gasometria com lactato.
4. Iniciar Antimalárico de Emergência:
Artesunato, solução injetável.
Dose: Prescrever na dose de 2,4 mg/kg por via endovenosa, nas horas 0, 12 e 24. Após, manter a cada 24 horas até que o paciente possa tolerar a via oral.
5. Manejo de Suporte (prescrever conforme necessidade):
Hipoglicemia (<60 mg/dL): Glicose 25%, 2 mL/kg, IV, em bolus. Manter infusão contínua de Soro Glicosado 10%.
Convulsões: Diazepam 0,2-0,5 mg/kg, IV. Investigar e corrigir hipoglicemia como causa.
Anemia Grave (Hb < 5 g/dL): Transfusão de Concentrado de Hemácias 10-15 mL/kg, IV.
Insuficiência Renal: Manejo hídrico rigoroso e considerar terapia de substituição renal.
* Febre: Dipirona 20 mg/kg/dose, IV.
6. Após melhora e tolerância à via oral, completar o tratamento com o esquema de Artemeter + Lumefantrina por 3 dias.
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