Herpangina (Enterovírus)

Resumo

1. Definição e Fisiopatologia A Herpangina é uma doença infecciosa viral, aguda e autolimitada, caracterizada por uma estomatite ulcerativa dolorosa que afeta exclusivamente a porção posterior da orofaringe. É uma das manifestações clínicas mais comuns das infecções por enterovírus não-pólio, acometendo predominantemente lactentes e crianças pequenas (1 a 7 anos), com surtos frequentes no verão e outono. Etiologia É causada por vários sorotipos de enterovírus, principalmente do grupo Coxsackie

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Conduta Completa

1. Definição e Fisiopatologia A Herpangina é uma doença infecciosa viral, aguda e autolimitada, caracterizada por uma estomatite ulcerativa dolorosa que afeta exclusivamente a porção posterior da orofaringe. É uma das manifestações clínicas mais comuns das infecções por enterovírus não-pólio, acometendo predominantemente lactentes e crianças pequenas (1 a 7 anos), com surtos frequentes no verão e outono. Etiologia É causada por vários sorotipos de enterovírus, principalmente do grupo Coxsackie A. Menos frequentemente, pode ser causada por Coxsackie B, Echovírus e Enterovírus 71. Fisiopatologia Após a aquisição por via feco-oral ou respiratória, o vírus se replica no trato gastrointestinal e nos linfonodos locais. A viremia subsequente leva o vírus a seus sítios-alvo, que na herpangina são especificamente a mucosa do palato mole, os pilares amigdalianos, as tonsilas e a úvula. A replicação viral local causa a lise das células epiteliais, resultando nas vesículas e úlceras características. 2. Avaliação Clínica e Diagnóstico O diagnóstico da herpangina é eminentemente clínico, baseado na combinação de sintomas sistêmicos e, crucialmente, na topografia das lesões orais. História e Manifestações Clínicas: Início Súbito: O quadro começa abruptamente com febre alta (39-40°C), mal-estar, irritabilidade e recusa alimentar. Sintoma Principal: A dor de garganta (odinofagia) é intensa e desproporcional ao que se vê inicialmente. A criança recusa-se a engolir, o que leva à sialorreia (babação) e ao risco de desidratação. Exame da Orofaringe (Achado Patognomônico): O achado que define a doença é a presença de pequenas vesículas (1-2 mm) com um halo eritematoso, que rapidamente se rompem formando úlceras rasas (2-4 mm), localizadas exclusivamente na orofaringe posterior: Palato mole Pilares amigdalianos anteriores Úvula Tonsilas Importante: A mucosa oral anterior (gengiva, lábios, mucosa jugal) está caracteristicamente poupada. 3. Diagnóstico Diferencial É fundamental diferenciar a herpangina de outras estomatites agudas. Síndrome Mão-Pé-Boca (SMPB): É o principal diferencial. Embora causada pelos mesmos vírus, a SMPB apresenta a tríade de lesões na boca, mãos e pés. Na SMPB, as lesões orais podem acometer a parte anterior da boca. Gengivoestomatite Herpética Primária: Causada pelo herpes simples tipo 1. As lesões são mais extensas, acometem a mucosa oral anterior, e a gengiva fica intensamente edemaciada e sangrante, o que não ocorre na herpangina. Faringoamigdalite Estreptocócica: Apresenta exsudato purulento, não vesículas ou úlceras. Aftas (Estomatite Aftosa Recorrente): Geralmente não cursam com febre alta e são recorrentes. 4. Manejo e Tratamento Não existe terapia antiviral específica. O tratamento é inteiramente de suporte, focado em analgesia e hidratação. Pilar 1: Controle da Dor A analgesia sistêmica deve ser prescrita de forma regrada, e não apenas se necessário. Ibuprofeno é frequentemente preferido por seu efeito anti-inflamatório adicional. Paracetamol e Dipirona são alternativas eficazes. Anestésicos tópicos orais (lidocaína gel) podem ser usados com cautela antes das refeições em crianças maiores, mas devem ser evitados em lactentes pelo risco de anestesiar a glote e causar aspiração. Pilar 2: Hidratação É o ponto mais crítico do manejo. A criança deve ser estimulada a ingerir líquidos frios ou gelados. Oferecer leite, água, sorvetes, gelatinas e picolés. Evitar alimentos e líquidos ácidos (sucos cítricos, tomate), salgados ou quentes, pois exacerbam a dor. Hospitalização: A principal indicação para internação é a desidratação por recusa de líquidos, que necessita de hidratação endovenosa. 5. Complicações, Prognóstico e Prevenção Complicações: São raras. A desidratação é a mais comum. Complicações neurológicas como a meningite asséptica são excepcionais. Prognóstico: É excelente. A herpangina é uma doença autolimitada que se resolve completamente em 3 a 7 dias. Prevenção: Baseia-se em medidas de higiene, como a lavagem rigorosa das mãos e a desinfecção de superfícies e brinquedos em ambientes coletivos (creches), para interromper a transmissão feco-oral. Referências Bibliográficas 1. American Academy of Pediatrics. Enterovirus (Nonpoliovirus) Infections. In: Red Book: 2024 Report of the Committee on Infectious Diseases (33rd ed.). (A principal diretriz clínica pediátrica norte-americana). 2. Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). (2019). Doenças Exantemáticas na Infância. Manual de Orientação. 3. Cherry, J. D., & Krogstad, P. (2018). Enteroviruses: Coxsackieviruses, Echoviruses, and Polioviruses. In Feigin and Cherry's Textbook of Pediatric Infectious Diseases (8th ed.). 4. Romero, J. R. (2022). Hand, foot, and mouth disease and herpangina. In UpToDate. Retrieved from https://www.uptodate.com. 5. Guerra, A. M., & Waseem, M. (2023). Herpangina. In StatPearls. StatPearls Publishing. (Artigo de revisão atualizado e de acesso rápido). 6. Long, S. S., Prober, C. G., & Fischer, M. (2017). Principles and Practice of Pediatric Infectious Diseases* (5th ed.). Elsevier.

Tratamento

1. Orientações Gerais ao Prescritor O diagnóstico da herpangina é clínico, baseado na localização exclusiva das úlceras na orofaringe posterior. O tratamento é suportivo. A prescrição deve focar em analgesia regrada e hidratação oral intensiva. Antibióticos e antivirais não são indicados. A principal função do médico é orientar a família sobre a evolução benigna e, crucialmente, sobre os sinais de alerta para desidratação. 2. Prescrição para Manejo Sintomático Ambulatorial Analgesia Sistêmica (prescrever de forma regrada): Prescrição (Primeira Escolha): 1. Ibuprofeno suspensão oral 100mg/mL. Prescrever na dose de 10 mg/kg/dose, por via oral, a cada 8 horas, de forma regrada nas primeiras 48-72 horas. (Não usar em < 6 meses). Prescrição (Alternativa): 1. Dipirona solução oral 500mg/mL. Prescrever na dose de 20 mg/kg/dose, por via oral, a cada 6 horas, de forma regrada ou se dor/febre. Hidratação e Dieta: 1. Orientar a oferta frequente e em pequenos volumes de líquidos frios ou gelados (água, leite, chás). 2. Incentivar o consumo de alimentos pastosos e frios, como sorvetes, gelatinas e iogurtes. 3. Proibir estritamente alimentos e líquidos ácidos (sucos de laranja, limão, abacaxi), salgados ou quentes. Terapia Tópica Oral (uso criterioso e limitado): Prescrição (para crianças maiores, 15 min antes de tentar alimentar): 1. Lidocaína Gel 2%. 2. Modo de Usar: Aplicar uma quantidade mínima (equivalente a um grão de arroz) com um cotonete diretamente sobre as úlceras. Usar no máximo 3 a 4 vezes ao dia. 3. Prescrição de Orientações para a Família e Sinais de Alerta Fornecer por escrito: 1. Sobre a Doença: "Seu filho(a) tem uma infecção viral comum e benigna chamada Herpangina. Ela causa febre alta e feridas muito dolorosas no fundo da garganta. A doença melhora sozinha em cerca de 3 a 7 dias." 2. Tratamento: "O mais importante é controlar a dor com o analgésico prescrito em horários fixos e oferecer líquidos gelados o tempo todo para evitar a desidratação." 3. Contágio e Isolamento: "A doença é contagiosa. A criança deve ser afastada da creche/escola até ficar sem febre por 24 horas e conseguir se alimentar bem. Lave as mãos com frequência." 4. Sinais de Alerta para Retorno Imediato ao Pronto-Socorro (Sinais de Desidratação): Boca muito seca, choro sem lágrimas. Diminuição importante do volume de urina (fralda seca por mais de 6-8 horas). Criança muito sonolenta, apática ou irritada. Recusa completa de todos os líquidos oferecidos por várias horas. 4. Critérios e Prescrição para Hospitalização Indicação: Desidratação moderada a grave por recusa de líquidos. Prescrição de Admissão: 1. Admitir em Unidade de Internação Pediátrica. 2. Manter em jejum (NPO) inicialmente. 3. Manter acesso venoso periférico. 4. Prescrever Hidratação Venosa: Fase Rápida (se desidratação moderada): Soro Fisiológico 0,9%, 20 mL/kg, IV, para infundir em 1 a 2 horas. * Manutenção: Iniciar Soro Glicofisiológico (SGF) para cobrir as necessidades hídricas basais e o déficit restante. 5. Prescrever Dipirona 20 mg/kg/dose, IV, de 6 em 6 horas, de forma regrada. 6. Reintroduzir a dieta via oral com líquidos frios assim que a criança estiver mais confortável e hidratada.

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