Mononucleose Infecciosa (EBV)

Resumo

1. Definição e Fisiopatologia A Mononucleose Infecciosa (MI), popularmente conhecida como "doença do beijo", é uma síndrome clínica causada primariamente pelo Vírus Epstein-Barr (EBV), um membro da família Herpesviridae. É uma doença de distribuição universal, com mais de 90% da população adulta mundial sendo soropositiva. A apresentação clínica clássica ocorre quando a primo-infecção pelo EBV acontece na adolescência ou início da vida adulta. Fisiopatologia: O EBV é transmitido principalmente

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Conduta Completa

1. Definição e Fisiopatologia A Mononucleose Infecciosa (MI), popularmente conhecida como "doença do beijo", é uma síndrome clínica causada primariamente pelo Vírus Epstein-Barr (EBV), um membro da família Herpesviridae. É uma doença de distribuição universal, com mais de 90% da população adulta mundial sendo soropositiva. A apresentação clínica clássica ocorre quando a primo-infecção pelo EBV acontece na adolescência ou início da vida adulta. Fisiopatologia: O EBV é transmitido principalmente pela saliva. O vírus infecta as células epiteliais da orofaringe e os linfócitos B, nos quais estabelece uma infecção latente por toda a vida. A resposta imune do hospedeiro a essa infecção é vigorosa, com uma proliferação maciça de linfócitos T citotóxicos (CD8+) para controlar os linfócitos B infectados. São esses linfócitos T reativos que aparecem no sangue periférico como os característicos "linfócitos atípicos" e que são responsáveis pela maioria dos sinais e sintomas da doença, como a febre, a linfadenopatia e a hepatoesplenomegalia. 2. Avaliação Clínica e Diagnóstico O diagnóstico é baseado na combinação de achados clínicos e laboratoriais. Manifestações Clínicas: Período de Incubação: Longo, de 30 a 50 dias. Tríade Clássica: Febre: Geralmente alta (38-40°C) e pode ser prolongada, durando de 1 a 2 semanas. Faringoamigdalite: Dor de garganta intensa, com amígdalas hiperemiadas e frequentemente cobertas por um exsudato branco-acinzentado espesso. Petéquias no palato são um achado comum. Linfadenopatia: Aumento dos gânglios linfáticos, que são simétricos, móveis e dolorosos. A cadeia cervical posterior é a mais caracteristicamente acometida, mas a linfadenopatia é geralmente generalizada. Achados Adicionais Importantes: Esplenomegalia: Ocorre em cerca de 50% dos casos, atingindo seu pico na segunda semana. É o achado que impõe a maior restrição ao paciente, devido ao risco de ruptura. Astenia (Fadiga): É um sintoma marcante, muitas vezes intenso e prolongado, podendo persistir por semanas ou meses após a resolução da fase aguda. Edema Palpebral: Presente em cerca de um terço dos pacientes, é um sinal sugestivo. Exantema Maculopapular: Ocorre em 5-15% dos casos. No entanto, se o paciente for tratado inadvertidamente com Ampicilina ou Amoxicilina, um rash pruriginoso e generalizado surge em mais de 90% dos casos (não representa uma alergia verdadeira). Diagnóstico Laboratorial: Hemograma: O achado mais característico é a linfocitose (>50% do total de leucócitos) com a presença de mais de 10% de linfócitos atípicos. Leucocitose e trombocitopenia leve também são comuns. Teste de Anticorpos Heterófilos (Monospot): É um teste rápido e útil, positivo em cerca de 85-90% dos adolescentes e adultos. Sua sensibilidade é baixa em crianças menores de 4 anos. Sorologia Específica para EBV: É o método confirmatório definitivo. IgM anti-VCA (Antígeno do Capsídeo Viral): Marcador de infecção aguda. IgG anti-VCA: Surge na fase aguda e persiste por toda a vida (marcador de infecção pregressa). IgG anti-EBNA (Antígeno Nuclear): Surge tardiamente (6-12 semanas após o início) e indica infecção passada. 3. Manejo e Tratamento O tratamento da mononucleose não complicada é exclusivamente de suporte. Medidas Gerais: Repouso: Relativo, conforme a tolerância do paciente, especialmente durante a fase febril e de astenia intensa. Hidratação e Analgesia: Incentivar a ingestão de líquidos e usar analgésicos/antitérmicos (Paracetamol, Dipirona) para controle da febre e da dor de garganta. Restrição de Atividades Físicas: Devido ao risco de ruptura esplênica, todos os pacientes com mononucleose devem ser orientados a evitar esportes de contato e atividades físicas intensas por pelo menos 3 a 4 semanas a partir do início dos sintomas. A liberação para o retorno deve ser individualizada. Uso de Corticosteroides: Não são recomendados de rotina. Seu uso é reservado para complicações específicas, como: Obstrução iminente das vias aéreas por hipertrofia amigdaliana maciça. Complicações hematológicas graves (anemia hemolítica autoimune, trombocitopenia severa). Complicações neurológicas. Uso de Antivirais (Aciclovir): Não demonstrou benefício clínico significativo na mononucleose não complicada e não é recomendado. 4. Complicações Embora a maioria dos casos seja benigna, complicações podem ocorrer. Ruptura Esplênica: É a complicação mais temida, embora rara (0,1-0,5%). Ocorre geralmente na 2ª ou 3ª semana de doença e se manifesta como dor abdominal súbita e intensa, com sinais de choque hipovolêmico. É uma emergência cirúrgica. Obstrução de Vias Aéreas: Pode ocorrer devido à hipertrofia maciça do anel de Waldeyer. Complicações Hematológicas: Anemia hemolítica autoimune e trombocitopenia. Complicações Neurológicas: Raras, incluem meningite, encefalite e Síndrome de Guillain-Barré. Referências Bibliográficas American Academy of Pediatrics. Epstein-Barr Virus Infections. In: Red Book: 2024 Report of the Committee on Infectious Diseases (33rd ed.). (A principal diretriz clínica pediátrica norte-americana). Luzuriaga, K., & Sullivan, J. L. (2010). Infectious mononucleosis. The New England Journal of Medicine, 362(21), 1993–2000. (Artigo de revisão clássico e fundamental do NEJM). Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). (2020). Mononucleose Infecciosa. Documento Científico. Balfour, H. H., Jr., Dunmire, S. K., & Hogquist, K. A. (2015). Infectious mononucleosis. Clinical & Translational Immunology, 4(2), e33. (Revisão aprofundada da imunopatogênese). Ebell, M. H. (2018). Epstein-Barr Virus Infectious Mononucleosis. American Family Physician, 98(12), 715-720. (Guia prático para a atenção primária). Hurt, C., & Tammaro, D. (2007). Diagnostic evaluation of mononucleosis-like illnesses. The American Journal of Medicine, 120*(10), 911.e1–911.e8. (Foco no diagnóstico diferencial).

Tratamento

1. Orientações Gerais ao Prescritor O tratamento da mononucleose é suportivo. A prescrição deve focar em analgesia, hidratação e, crucialmente, na orientação sobre a restrição de atividades físicas. NÃO PRESCREVER Ampicilina ou Amoxicilina para a faringite, devido ao risco de 90% de desenvolvimento de um rash cutâneo. Corticosteroides são reservados para complicações específicas e não devem ser usados de rotina. 2. Prescrição para Manejo Sintomático Ambulatorial Repouso e Hidratação: 1. Orientar repouso relativo, conforme a tolerância do paciente, evitando atividades extenuantes. 2. Incentivar a ingestão de líquidos e oferecer dieta pastosa/líquida e fria para aliviar a dor de garganta. Analgesia e Controle da Febre: Prescrição: 1. Dipirona solução oral 500mg/mL. Prescrever na dose de 20 mg/kg/dose, por via oral, a cada 6 horas, se febre ou dor. 2. ou Ibuprofeno suspensão oral 100mg/mL. Prescrever na dose de 10 mg/kg/dose, por via oral, a cada 8 horas, se febre ou dor. 3. Prescrição para Restrição de Atividades Físicas (Obrigatória) Prescrição/Atestado Médico: 1. Atesto que o(a) paciente [Nome do Paciente] está em tratamento para Mononucleose Infecciosa e, devido ao risco de ruptura esplênica, deve permanecer afastado(a) de todas as atividades físicas, esportes (especialmente os de contato) e aulas de educação física pelo período de 4 (quatro) semanas a partir desta data. 2. A liberação para o retorno às atividades está condicionada a uma reavaliação médica após este período. 4. Prescrição de Corticosteroides (Apenas para Indicações Precisas) Indicação: Obstrução de vias aéreas superiores com estridor ou dispneia; trombocitopenia grave (<20.000/mm³) com sangramento; ou anemia hemolítica autoimune grave. Prescrição (Manejo Hospitalar): 1. Prednisona comprimido 20mg ou Prednisolona suspensão oral. 2. Dose: Prescrever na dose de 1 mg/kg/dia (dose máxima de 60 mg/dia), por via oral. 3. Duração: Manter por 5 a 7 dias, com desmame gradual ao longo da semana seguinte. 5. Orientações para a Família e Sinais de Alerta Fornecer por escrito: Sobre a Doença: "A mononucleose é uma infecção viral que geralmente melhora sozinha, mas a recuperação pode ser lenta, com cansaço persistente por semanas." Transmissão: "A doença é transmitida pela saliva. Evite compartilhar copos, talheres e beijar outras pessoas durante a fase aguda." Restrição de Atividades: "É absolutamente proibido praticar esportes ou atividades de impacto por pelo menos 4 semanas, mesmo que se sinta bem, pelo risco de ruptura do baço." Sinais de Alerta para Retorno Imediato ao Pronto-Socorro: Dor abdominal súbita e intensa, especialmente no lado esquerdo superior do abdome. Dificuldade para respirar ou engolir. Tontura, palidez intensa ou sensação de desmaio. Diminuição do volume de urina ou urina muito escura.

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