Displasia Broncopulmonar

Resumo

1. Definição e Fisiopatologia A Displasia Broncopulmonar (DBP) é a doença pulmonar crônica mais comum em recém-nascidos prematuros e a principal causa de morbidade respiratória a longo prazo nesta população. A definição mais aceita, proposta pelo NIH (National Institutes of Health dos EUA), baseia-se na necessidade de oxigênio suplementar por pelo menos 28 dias, com a gravidade sendo classificada na idade pós-menstrual de 36 semanas. Fisiopatologia: A "Nova DBP" A DBP de hoje é diferente da "cl

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Conduta Completa

1. Definição e Fisiopatologia A Displasia Broncopulmonar (DBP) é a doença pulmonar crônica mais comum em recém-nascidos prematuros e a principal causa de morbidade respiratória a longo prazo nesta população. A definição mais aceita, proposta pelo NIH (National Institutes of Health dos EUA), baseia-se na necessidade de oxigênio suplementar por pelo menos 28 dias, com a gravidade sendo classificada na idade pós-menstrual de 36 semanas. Fisiopatologia: A "Nova DBP" A DBP de hoje é diferente da "clássica" descrita na década de 60. A DBP clássica era uma doença de fibrose e lesão de vias aéreas, causada por altas pressões e concentrações de oxigênio em prematuros maiores. A "nova DBP", que vemos nos prematuros extremos atuais, é primariamente uma doença de desenvolvimento pulmonar interrompido. A prematuridade extrema interrompe o desenvolvimento pulmonar na fase sacular/alveolar. Fatores pós-natais como a ventilação mecânica (mesmo que gentil), a toxicidade do oxigênio e a inflamação (por infecção ou outros insultos) impedem a retomada normal desse desenvolvimento. O resultado é um pulmão com simplificação alveolar (menos alvéolos e maiores, com menor área de troca gasosa) e displasia vascular (vasos sanguíneos pulmonares anormais e em menor número). Essa alteração vascular é a base para a principal e mais temida complicação: a hipertensão pulmonar. 2. Classificação de Gravidade (Critérios do NIH) A gravidade é avaliada às 36 semanas de idade pós-menstrual (ou na alta, o que vier primeiro): DBP Leve: O paciente não necessita de oxigênio suplementar nesta idade. DBP Moderada: Necessidade de oxigênio em baixa concentração (FiO₂ < 30%). DBP Grave: Necessidade de oxigênio em alta concentração (FiO₂ ≥ 30%) e/ou suporte com pressão positiva (CPAP ou ventilação mecânica). 3. Fatores de Risco O principal fator de risco é a prematuridade extrema (idade gestacional < 28 semanas). Outros fatores importantes incluem: Ventilação mecânica prolongada. Altas concentrações de oxigênio. Infecções perinatais (corioamnionite) e pós-natais (sepse). Persistência do Canal Arterial (PCA) com repercussão hemodinâmica. Restrição de crescimento intrauterino. 4. Manifestações Clínicas e Diagnóstico O diagnóstico é feito com base nos critérios de dependência de oxigênio. O quadro clínico é de uma insuficiência respiratória crônica: Sintomas Respiratórios: Taquipneia persistente, tiragens intercostais/subcostais, episódios de sibilância (hiper-reatividade brônquica) e necessidade contínua de oxigênio para manter a saturação adequada (alvo: 92-95%). Dificuldades Nutricionais: Aumento do gasto energético pelo trabalho respiratório, levando a dificuldades de ganho de peso ("failure to thrive"). Hipertensão Pulmonar (HP): É a complicação mais grave e deve ser ativamente investigada. Pode se manifestar por piora da hipoxemia e, tardiamente, por sinais de falência do ventrículo direito (cor pulmonale). Exames Complementares: Radiografia de Tórax: Mostra achados característicos de hiperinsuflação difusa, opacidades intersticiais lineares e áreas de atelectasia. Ecocardiograma: Exame fundamental e obrigatório para rastrear e monitorar a hipertensão pulmonar e avaliar a função do ventrículo direito. 5. Manejo e Tratamento: A Abordagem Multidisciplinar O tratamento da DBP é prolongado e requer uma equipe com pneumologista, cardiologista, nutricionista e fisioterapeuta. Prevenção (Estratégias na UTI Neonatal) Corticosteroides Antenatais: Para gestantes em risco de parto prematuro. Surfactante Exógeno: Administração precoce para prematuros com SDR. Ventilação Mecânica Protetora: Estratégias que utilizam baixos volumes correntes, pressões controladas e evitam a toxicidade do oxigênio. Tratamento da DBP Estabelecida Suporte Respiratório: Oxigenoterapia Domiciliar: É o pilar do tratamento. O objetivo é manter a SatO₂ entre 92-95% para garantir o crescimento somático e pulmonar adequado e, crucialmente, prevenir e tratar a hipertensão pulmonar. Desmame do Oxigênio: É lento e gradual, guiado por oximetrias contínuas, incluindo durante o sono e a alimentação. Terapia Farmacológica: Diuréticos: Frequentemente usados (ex: Hidroclorotiazida + Espironolactona) para manejar o componente de edema pulmonar crônico. Broncodilatadores: Podem ser usados em caso de hiper-reatividade brônquica, mas não são rotina. Corticosteroides: Cursos curtos de corticoides sistêmicos podem ser usados em exacerbações. O uso crônico é controverso e deve ser evitado devido aos efeitos adversos no neurodesenvolvimento. Suporte Nutricional Agressivo: A necessidade calórica é muito elevada (120 a 150 kcal/kg/dia). Utilizam-se fórmulas hipercalóricas, suplementação de proteínas e, por vezes, nutrição por sonda para garantir o crescimento "catch-up". Profilaxia de Infecções: Palivizumabe: A imunoprofilaxia contra o VSR é indicada para crianças com DBP em uso de oxigênio ou outras terapias nos últimos 6 meses, durante a sazonalidade do vírus. Vacinação: O calendário vacinal deve ser rigorosamente seguido, incluindo a vacina anual contra a Influenza. 6. Prognóstico e Seguimento A função pulmonar melhora progressivamente com o crescimento e a formação de novos alvéolos durante os primeiros anos de vida. No entanto, muitos pacientes persistem com alterações na função pulmonar e hiper-reatividade brônquica na vida adulta. O prognóstico é determinado pela gravidade da DBP e, principalmente, pela presença e gravidade da hipertensão pulmonar associada. O seguimento multidisciplinar a longo prazo é essencial. Referências Bibliográficas 1. Higgins, R. D., Jobe, A. H., Koso-Thomas, M., et al. (2018). Bronchopulmonary Dysplasia: Executive Summary of a Workshop. The Journal of Pediatrics, 197, 300-308. (O consenso do NIH que define a DBP moderna e estabelece as prioridades de pesquisa). 2. Jobe, A. H., & Bancalari, E. (2001). Bronchopulmonary dysplasia. American journal of respiratory and critical care medicine, 163(7), 1723-1729. (Artigo de revisão clássico que definiu a transição da "velha" para a "nova" DBP). 3. Abman, S. H., et al. (2017). Interdisciplinary care of children with severe bronchopulmonary dysplasia. The Journal of Pediatrics, 181, 12-28. (Excelente guia sobre o manejo multidisciplinar). 4. American Academy of Pediatrics, COMMITTEE ON FETUS AND NEWBORN. (2014). Respiratory Support in Preterm Infants at Birth. Pediatrics, 133(1), 171-174. (Diretriz da AAP sobre as estratégias de prevenção). 5. Theile, A., et al. (2022). Update on Bronchopulmonary Dysplasia: A Review of a Chronic Lung Disease of Prematurity. Klinische Pädiatrie, 234(05), 269-276. 6. Jensen, E. A., & Schmidt, B. (2014). Epidemiology of bronchopulmonary dysplasia. Birth Defects Research Part A: Clinical and Molecular Teratology, 100(3), 145-157.

Tratamento

1. Orientações Gerais ao Prescritor A DBP é uma doença crônica de manejo ambulatorial complexo após a alta da UTI Neonatal. As prescrições visam quatro pilares: suporte de oxigênio, otimização nutricional, controle de fluidos e prevenção de infecções. O acompanhamento com a equipe multidisciplinar (Pneumologista, Cardiologista, Nutricionista) é essencial para os ajustes terapêuticos. 2. Prescrição para Oxigenoterapia Domiciliar Prescrição: 1. Oxigênio domiciliar via cateter nasal, para uso contínuo. 2. Fluxo: Iniciar com [ex: 0,5 L/min] e titular para manter a Saturação de O₂ alvo entre 92% e 95% durante a vigília, sono e alimentação. 3. A família deve ser treinada no manuseio do equipamento (concentrador e cilindro portátil) e na leitura do oxímetro de pulso. Monitoramento: 1. Realizar oximetria de pulso domiciliar e registrar os valores diariamente. 2. Agendar oximetria noturna contínua (polissonografia simplificada) a cada 1-3 meses para guiar o desmame. 3. Prescrição para Terapia Diurética Indicação: Manejo do edema pulmonar crônico e auxílio no desmame do oxigênio. Prescrição (Esquema Comum): 1. Hidroclorotiazida suspensão oral. Prescrever na dose de 1 a 2 mg/kg/dia, dividida em 2 tomadas (de 12/12h). 2. Espironolactona suspensão oral. Prescrever na dose de 1 a 2 mg/kg/dia, dividida em 1 ou 2 tomadas, para ser administrada junto com a hidroclorotiazida. Monitoramento: Solicitar dosagem de eletrólitos (sódio e potássio) a cada 1-2 meses. 4. Prescrição para Suporte Nutricional Agressivo Dieta e Fórmula: 1. Manter Fórmula Infantil para Prematuros ou Fórmula Hipercalórica para atingir uma densidade calórica de 24 a 27 kcal/30mL. 2. Orientar dieta com oferta calórica elevada, entre 120 e 150 kcal/kg/dia. Suplementação Vitamínica e Mineral: 1. Prescrever fórmula polivitamínica pediátrica. 2. Suplementação de Ferro: Prescrever na dose de 2 a 4 mg/kg/dia, por via oral. 3. Considerar suplementação adicional de Vitamina A e Vitamina D. 5. Prescrição para Profilaxia de Infecção por VSR Indicação: Crianças < 2 anos com DBP que necessitaram de tratamento (O₂, diuréticos, corticoides) nos últimos 6 meses. Prescrição: 1. Palivizumabe, solução injetável. 2. Dose: Prescrever na dose de 15 mg/kg, por via Intramuscular (IM) profunda. 3. Frequência: Administrar mensalmente durante o período de sazonalidade do VSR (geralmente de março a agosto no Sudeste do Brasil), em um total de até 5 doses. 6. Orientações para a Família e Sinais de Alerta Prevenção de Infecções: 1. A higiene rigorosa das mãos é a medida mais importante. 2. Evitar contato com pessoas doentes e ambientes fechados com aglomeração. 3. Proibir estritamente o tabagismo no domicílio. 4. Manter o calendário vacinal da criança e dos cuidadores em dia. Sinais de Alerta para Procurar Atendimento de Emergência: 1. Aumento do esforço para respirar (tiragem, respiração mais rápida). 2. Surgimento ou piora da cianose (lábios ou extremidades azulados). 3. Recusa alimentar ou vômitos. 4. Sonolência ou irritabilidade excessivas. 5. Febre.

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