Síndrome Nefrítica Aguda
Resumo
1. Definição e Fisiopatologia
A Síndrome Nefrítica Aguda é uma apresentação clínica de doença glomerular, caracterizada pela inflamação aguda dos glomérulos. A causa mais comum e o protótipo desta síndrome na infância é a Glomerulonefrite Difusa Aguda Pós-Estreptocócica (GNPE).
Fisiopatologia
A GNPE não é uma infecção renal direta, mas sim uma glomerulopatia por imunocomplexos. Após uma infecção de orofaringe ou de pele por cepas nefritogênicas do Streptococcus pyogenes, antígenos estreptocócic
Categoria
Nefrologia e Urologia > Glomerulopatias > Síndrome Nefrítica Aguda
Conduta Completa
1. Definição e Fisiopatologia
A Síndrome Nefrítica Aguda é uma apresentação clínica de doença glomerular, caracterizada pela inflamação aguda dos glomérulos. A causa mais comum e o protótipo desta síndrome na infância é a Glomerulonefrite Difusa Aguda Pós-Estreptocócica (GNPE).
Fisiopatologia
A GNPE não é uma infecção renal direta, mas sim uma glomerulopatia por imunocomplexos. Após uma infecção de orofaringe ou de pele por cepas nefritogênicas do Streptococcus pyogenes, antígenos estreptocócicos se depositam nos glomérulos. Isso desencadeia uma intensa ativação da via alternativa do complemento, que é o evento central da lesão. A cascata inflamatória resultante leva à proliferação de células glomerulares, infiltração de leucócitos e dano à barreira de filtração, resultando na diminuição da taxa de filtração glomerular e na perda de hemácias e proteínas na urina.
Período de Latência
Há um intervalo característico entre a infecção inicial e o surgimento dos sintomas renais:
Após Faringoamigdalite: 1 a 3 semanas.
Após Piodermite (impetigo): 3 a 6 semanas.
2. Avaliação Clínica e Diagnóstico
O diagnóstico é baseado na combinação da apresentação clínica clássica com a evidência de uma infecção estreptocócica recente.
Manifestações Clínicas (Síndrome Nefrítica Clássica)
Hematúria: É o sinal universal. A urina tipicamente se apresenta com coloração escura ("cor de Coca-Cola").
Edema: Geralmente de início súbito, periorbital e matutino, podendo progredir para anasarca. É causado pela retenção de sódio e água.
Hipertensão Arterial: Ocorre em 60-80% dos casos devido à hipervolemia. Pode ser a complicação mais grave.
Oligúria: Diminuição do volume urinário.
Diagnóstico Laboratorial
Análise de Urina (EAS): Confirma a hematúria (frequentemente com dismorfismo eritrocitário) e a presença de cilindros hemáticos, que são patognomônicos de lesão glomerular.
Função Renal: Elevação transitória da Ureia e da Creatinina.
Evidência de Infecção Estreptocócica: Títulos elevados de ASO (Antiestreptolisina O) (para infecção faríngea) ou Anti-DNase B (para infecção de pele).
Marcador Imunológico Chave: Níveis baixos ou consumidos de Complemento C3 sérico estão presentes em mais de 90% dos casos. A normalização do C3 em 6 a 8 semanas é um critério essencial para confirmar o diagnóstico. A persistência de C3 baixo além de 8-12 semanas exige a investigação de outras glomerulopatias.
Biópsia Renal
Raramente indicada em crianças com quadro típico. É reservada para casos com apresentação atípica, insuficiência renal rapidamente progressiva ou ausência de normalização do C3.
3. Manejo e Tratamento
Não existe tratamento específico para a lesão glomerular. O manejo é inteiramente de suporte, focado no controle das complicações da hipervolemia.
Medidas Gerais
A hospitalização é indicada para a maioria dos casos na fase aguda para monitoramento rigoroso.
Manejo da Hipervolemia e do Edema
Restrição Hídrica e Salina: É a medida mais importante. A restrição de sódio deve ser rigorosa. O volume hídrico total diário deve ser calculado de forma explícita: Volume Total (24h) = Diurese (das 24h anteriores) + Perdas Insensíveis (aprox. 400 mL/m² de superfície corporal).
Diuréticos de Alça (Furosemida): Utilizados para controlar o edema e a hipertensão. A via endovenosa é reservada para casos com edema pulmonar, hipertensão grave ou falha da terapia oral.
Manejo da Hipertensão Arterial
Além da restrição de sal e diuréticos, vasodilatadores como os bloqueadores dos canais de cálcio (Anlodipino) ou inibidores da ECA (Enalapril) podem ser necessários.
Antibioticoterapia
O tratamento da glomerulonefrite em si não é com antibióticos. No entanto, se houver evidência de infecção estreptocócica ativa no momento do diagnóstico, um curso de 10 dias de Penicilina ou Amoxicilina deve ser prescrito. É importante reforçar que esta medida visa erradicar a bactéria, prevenir a transmissão e reduzir o risco de febre reumática, mas não altera o curso da lesão renal já estabelecida.
4. Prognóstico e Seguimento
O prognóstico da GNPE na infância é excelente. Mais de 95% das crianças se recuperam completamente. O acompanhamento ambulatorial é necessário para monitorar a pressão arterial e a normalização dos exames de urina.
Referências Bibliográficas
Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO). KDIGO 2021 Clinical Practice Guideline for the Management of Glomerular Diseases. Kidney International. 2021;100(4S):S1–S276.
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Niaudet P, Boyer O. Poststreptococcal glomerulonephritis. In: UpToDate. 2023.
Tratamento
1. Orientações Gerais ao Prescritor
A Síndrome Nefrítica é uma condição de manejo suportivo. A prescrição deve focar no controle da volemia e da pressão arterial.
A hospitalização é indicada na fase aguda para a maioria das crianças, para monitoramento rigoroso.
O tratamento da infecção estreptocócica subjacente não altera o curso da glomerulonefrite, mas é importante para a saúde pública.
2. Prescrição de Admissão Hospitalar
1. Admitir em leito de enfermaria pediátrica.
2. Prescrever Repouso relativo no leito.
3. Prescrever Dieta Hipossódica Estrita.
4. Prescrever Restrição Hídrica: Volume total diário = [Volume da Diurese das últimas 24h + 400 mL/m² (perdas insensíveis)].
5. Instalar monitorização de sinais vitais a cada 4-6 horas e Peso diário.
6. Coletar exames de admissão: Hemograma, Ureia, Creatinina, Eletrólitos, ASO, Anti-DNase B e Complemento C3. Urina tipo I.
3. Prescrição para o Manejo da Hipervolemia e Hipertensão
Manejo do Edema e Hipertensão Leve a Moderada:
Prescrição (Primeira Linha):
1. Furosemida solução oral ou comprimido.
2. Dose: Prescrever na dose de 1 a 2 mg/kg/dose, por via oral, a cada 12 horas.
Prescrição (Se hipertensão persistir):
1. Anlodipino comprimido.
2. Dose: Prescrever na dose de 0,1 a 0,2 mg/kg/dia, por via oral, em dose única diária (dose máxima de 10 mg).
Manejo da Hipertensão Grave ou Edema Pulmonar:
Prescrição:
1. Furosemida 1 a 2 mg/kg/dose, por via endovenosa.
2. Considerar vasodilatadores endovenosos em ambiente de UTI, se emergência hipertensiva.
4. Prescrição para a Infecção Estreptocócica (se ativa)
Indicação:
Se houver evidência de faringite ou piodermite ativa no momento do diagnóstico.
Prescrição:
1. Penicilina G Benzatina, em dose única, por via Intramuscular.
Se peso < 27 kg: 600.000 UI.
Se peso ≥ 27 kg: 1.200.000 UI.
2. ou Amoxicilina suspensão oral, 50 mg/kg/dia, dividida de 8/8h, por 10 dias.
5. Prescrição de Alta e Seguimento Ambulatorial
Critérios de Alta:
Paciente normotenso, sem edema significativo, com diurese normalizada e função renal estável ou em melhora.
Prescrição de Alta:
1. Manter Dieta Hipossódica até a liberação pelo nefrologista.
2. Manter o(s) anti-hipertensivo(s) prescrito(s), com orientação de aferição da PA.
3. Orientar sobre a evolução natural da doença.
4. Agendar retorno ambulatorial em 1 semana com resultado de novos exames (Ureia, Creatinina, Urina I).
5. Agendar coleta de Complemento C3 em 8 semanas para confirmar a normalização.
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