Pielonefrite Aguda
Resumo
1. Definição e Fisiopatologia
A Pielonefrite Aguda é uma infecção do trato urinário (ITU) superior, caracterizada pela inflamação do parênquima renal e do sistema coletor (pelve e cálices). É a forma mais grave de ITU na infância, representando uma emergência infecciosa devido ao seu potencial de causar bacteremia, sepse e, crucialmente, lesão renal permanente (cicatriz renal).
Fisiopatologia
A pielonefrite resulta, na grande maioria dos casos, da ascensão de bactérias a partir de uma infecção
Categoria
Nefrologia e Urologia > Infecções do Trato Urinário > Pielonefrite Aguda
Conduta Completa
1. Definição e Fisiopatologia
A Pielonefrite Aguda é uma infecção do trato urinário (ITU) superior, caracterizada pela inflamação do parênquima renal e do sistema coletor (pelve e cálices). É a forma mais grave de ITU na infância, representando uma emergência infecciosa devido ao seu potencial de causar bacteremia, sepse e, crucialmente, lesão renal permanente (cicatriz renal).
Fisiopatologia
A pielonefrite resulta, na grande maioria dos casos, da ascensão de bactérias a partir de uma infecção vesical (cistite). Fatores que facilitam essa ascensão, como o Refluxo Vesicoureteral (RVU), ou que causam estase urinária, como obstruções anatômicas ou disfunções miccionais, são os principais predisponentes. Uma vez no rim, a resposta inflamatória à infecção bacteriana pode levar à destruição do tecido parenquimatoso e à subsequente formação de cicatrizes fibróticas, que são a base para complicações a longo prazo, como hipertensão arterial e doença renal crônica.
2. Etiologia e Fatores de Risco
Agentes Etiológicos
Escherichia coli uropatogênica (UPEC) é o agente mais comum, responsável por mais de 85% dos casos.
Outros bacilos Gram-negativos (Klebsiella, Proteus) e cocos Gram-positivos (Enterococcus) são menos frequentes.
Fatores de Risco
Idade: Lactentes jovens (< 1 ano) são particularmente vulneráveis.
Anomalias Anatômicas: O Refluxo Vesicoureteral (RVU) é o principal fator de risco. Outras anomalias obstrutivas também são importantes.
Disfunção Vesical e Intestinal (DVI): Em crianças maiores, a constipação e os maus hábitos miccionais são fatores de risco significativos.
Sexo Feminino: Após o primeiro ano de vida, devido à uretra mais curta.
Fimose em meninos não circuncidados.
3. Avaliação Clínica e Diagnóstico
O diagnóstico exige um alto índice de suspeição, especialmente em lactentes com febre sem foco.
Manifestações Clínicas
Lactentes (< 2 anos): O quadro é inespecífico. A febre alta (>38°C) sem uma causa aparente é a apresentação mais comum. Irritabilidade, recusa alimentar, vômitos e prostração são frequentes.
Crianças Maiores (> 2 anos): O quadro é mais clássico, com febre alta, calafrios, dor lombar ou em flanco (sinal de Giordano positivo), náuseas e vômitos. Podem estar presentes sintomas de cistite associada (disúria, polaciúria).
Diagnóstico Laboratorial: A Coleta de Urina é a Etapa Crítica
O diagnóstico de pielonefrite requer a confirmação de uma ITU por urocultura. Uma amostra de urina inadequada invalida o diagnóstico.
Métodos de Coleta Confiáveis:
Cateterismo Vesical: Método preferencial para crianças sem controle esfincteriano.
Punção Suprapúbica: Padrão-ouro, mas mais invasivo.
Jato Médio: Método de escolha para crianças com controle esfincteriano.
Saco Coletor: NÃO deve ser usado para urocultura devido à altíssima taxa de contaminação.
Análise Laboratorial:
Urina Tipo I (EAS): A presença de leucocitúria (piúria) e nitrito positivo é altamente sugestiva.
Urocultura com Antibiograma: É o padrão-ouro. Confirma o diagnóstico e guia a terapia definitiva.
Exames Sanguíneos: Hemograma (leucocitose com neutrofilia) e marcadores inflamatórios (PCR e Procalcitonina elevados) ajudam a confirmar a natureza sistêmica da infecção. Hemoculturas devem ser coletadas em pacientes com aspecto toxêmico.
4. Manejo e Tratamento
O tratamento deve ser iniciado prontamente para erradicar a infecção e prevenir a lesão renal.
Critérios de Hospitalização:
Idade < 2-3 meses.
Sinais de sepse ou aspecto toxêmico.
Desidratação ou vômitos que impeçam a terapia oral.
Falha no tratamento ambulatorial.
Impossibilidade de garantir o seguimento.
Antibioticoterapia:
A terapia empírica deve ser iniciada imediatamente após a coleta das culturas.
Tratamento Hospitalar (Endovenoso):
É a abordagem preferencial para a maioria dos casos de pielonefrite.
Primeira Escolha: Cefalosporinas de 3ª geração (Ceftriaxona) ou de 2ª geração (Cefuroxima). Aminoglicosídeos (Gentamicina) são uma alternativa eficaz.
Tratamento Ambulatorial (Oral):
Reservado para crianças maiores de 6 meses, clinicamente estáveis e com boa aceitação oral. A droga de escolha é uma Cefalosporina oral de 2ª ou 3ª geração.
Duração:
O tratamento total (IV + oral) é de 7 a 14 dias. Cursos mais curtos (7-10 dias) são eficazes para pielonefrite não complicada com boa resposta clínica.
5. Investigação Pós-Pielonefrite e Seguimento
Após o tratamento do primeiro episódio de pielonefrite, a investigação por imagem é recomendada para procurar por anomalias anatômicas.
Ultrassonografia de Rins e Vias Urinárias: Deve ser realizada em todas as crianças para avaliar a anatomia renal e procurar por hidronefrose ou abscessos.
Uretrocistografia Miccional (UCM): Indicada se o ultrassom for alterado ou em casos de ITU febril recorrente, para diagnosticar o Refluxo Vesicoureteral (RVU).
Cintilografia Renal com DMSA: É o melhor método para detectar cicatrizes renais. Deve ser realizada 4 a 6 meses após o episódio agudo.
Referências Bibliográficas
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Tratamento
1. Orientações Gerais ao Prescritor
A Pielonefrite é uma infecção grave que exige tratamento antibiótico imediato após a coleta de uma amostra de urina adequada para cultura.
A hospitalização é a conduta padrão para a maioria dos lactentes e crianças com quadro agudo, para garantir a terapia endovenosa inicial e a hidratação.
A escolha do antibiótico empírico deve ser baseada na epidemiologia local e ajustada conforme o antibiograma.
2. Prescrição para Investigação Diagnóstica
1. Solicito Exame de Urina Tipo I (EAS) e Urocultura com Antibiograma.
2. Método de Coleta Sugerido: Cateterismo vesical de alívio (para crianças sem controle esfincteriano).
3. Coletar 2 amostras de Hemocultura, se paciente toxêmico ou < 3 meses.
4. Coletar Hemograma completo e Proteína C Reativa (PCR).
3. Prescrição para Tratamento Hospitalar
Prescrição de Admissão:
1. Admitir em Unidade de Internação Pediátrica.
2. Manter acesso venoso periférico.
3. Iniciar Hidratação Venosa de Manutenção com solução glicofisiológica.
4. Prescrever Dipirona 20 mg/kg/dose (dose máxima de 1g), por via endovenosa, a cada 6 horas, se febre (T > 37,8°C) ou dor.
Antibioticoterapia Endovenosa Empírica:
Primeira Escolha:
1. Ceftriaxona 75 mg/kg/dia, por via endovenosa, em dose única diária (dose máxima de 2g/dia).
Alternativa:
1. Gentamicina 5 a 7,5 mg/kg/dia, por via endovenosa, em dose única diária.
Para Neonatos:
1. Ampicilina 100-150 mg/kg/dia, IV, de 8/8h.
2. Associar: Gentamicina 3 a 5 mg/kg/dia, IV, em dose única diária (para RN a termo).
4. Prescrição para Transição para Terapia Oral ("Switch Therapy")
Critérios: Paciente afebril há 24-48h, clinicamente estável, com melhora dos marcadores inflamatórios e boa aceitação da via oral.
Prescrição de Alta:
1. Suspender antibioticoterapia endovenosa.
2. Prescrever Cefalexina suspensão oral, na dose de 50 a 100 mg/kg/dia, por via oral, dividida de 6 em 6 horas, para completar um total de 7 a 14 dias de tratamento (somando os dias de terapia IV e VO).
5. Prescrição para Tratamento Ambulatorial (Casos Selecionados)
Indicação: Criança > 6 meses, clinicamente estável, sem vômitos, com garantia de seguimento.
Prescrição:
1. Cefuroxima axetil suspensão oral.
2. Dose: 30 mg/kg/dia, por via oral, dividida de 12/12h.
3. Duração: 10 a 14 dias.
4. Orientação: Agendar reavaliação clínica em 24-48 horas.
6. Prescrição para Investigação Pós-ITU Febril
1. Solicitar Ultrassonografia de Rins e Vias Urinárias (a ser realizada durante a internação ou logo após a alta).
2. Se indicado (ex: USG alterado, ITU recorrente), prescrever: Solicito Uretrocistografia Miccional (UCM) para investigação de Refluxo Vesicoureteral.
3. Se indicado (ex: RVU de alto grau, ITUs febris recorrentes), prescrever: Solicito Cintilografia Renal com DMSA para pesquisa de cicatrizes renais (realizar 4-6 meses após o episódio agudo).
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