Retinopatia da Prematuridade
Resumo
1. Definição e Contexto Clínico
A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma doença vasoproliferativa que acomete principalmente recém-nascidos prematuros, caracterizada por parada do desenvolvimento vascular retiniano normal seguida de neovascularização patológica e risco de cegueira. É hoje uma das principais causas de deficiência visual prevenível na infância, especialmente em países em desenvolvimento. O risco e a gravidade aumentam com menor idade gestacional e menor peso ao nascer.
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Neonatal > Patologias Neonatais Específicas > Retinopatia da Prematuridade
Conduta Completa
1. Definição e Contexto Clínico
A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma doença vasoproliferativa que acomete principalmente recém-nascidos prematuros, caracterizada por parada do desenvolvimento vascular retiniano normal seguida de neovascularização patológica e risco de cegueira. É hoje uma das principais causas de deficiência visual prevenível na infância, especialmente em países em desenvolvimento. O risco e a gravidade aumentam com menor idade gestacional e menor peso ao nascer.
Incidência: 15–20% dos prematuros <32 semanas; formas graves em 5–10% <28 semanas.
Fatores de risco principais: prematuridade (<32 sem), baixo peso (<1500g), oxigenoterapia e ventilação mecânica, instabilidade clínica, múltiplas transfusões, sepse.
Complicações: descolamento de retina, deficiência visual, miopia, estrabismo, ambliopia, glaucoma.
2. Fisiopatologia e Fatores de Risco
O desenvolvimento vascular retiniano ocorre de 16 a 40 semanas de gestação. Prematuros nascem com retina incompletamente vascularizada.
O uso de oxigênio em excesso (hiperoxia) interrompe a angiogênese, gerando área avascular periférica.
Posteriormente, ocorre hipóxia relativa, estimulando liberação de fatores angiogênicos (principalmente VEGF), levando à neovascularização patológica.
Fatores de risco adicionais: sepse, hemorragia intracraniana, persistência do canal arterial, instabilidade hemodinâmica, predisposição genética.
3. Triagem Oftalmológica
Indicação obrigatória:
Todos os RN com idade gestacional ≤32 semanas ou peso ≤1500g ao nascer.
RN >32 sem ou >1500g com fatores de risco (instabilidade clínica, ventilação mecânica prolongada, sepse grave, múltiplas transfusões).
Primeiro exame:
Deve ser realizado entre 4 e 6 semanas de vida OU 31–33 semanas de idade gestacional corrigida (o que ocorrer primeiro).
Preparação:
Colírios para midríase: tropicamida 0,5% + ciclopentolato 0,5%, 1 gota em cada olho, repetir após 15 min se necessário, iniciar 30–60 min antes do exame.
Anestésico tópico: proparacaína 0,5%, 1 gota antes do exame.
Monitorização dos sinais vitais durante o exame.
Técnica do exame:
Fundoscopia indireta binocular com depressor escleral, realizada por oftalmologista treinado em ROP.
Documentação: desenho esquemático ou fotografia do fundo de olho.
Seguimento:
Semanal para doença zona I ou A-ROP.
1–2 semanas para zona II.
2–3 semanas para zona III ou sem doença até vascularização completa (ou 45 semanas de idade corrigida).
4. Classificação
Pelo ICROP (International Classification of Retinopathy of Prematurity):
Zona I: círculo ao redor da mácula (2x distância disco-mácula); prognóstico mais grave.
Zona II: círculo da mácula até ora serrata nasal.
Zona III: crescente temporal periférica.
Estágios: 1 (linha demarcatória), 2 (crista), 3 (proliferação extraretiniana), 4A (descolamento parcial sem mácula), 4B (com mácula), 5 (descolamento total).
Doença “plus”: dilatação/tortuose vascular grave (risco aumentado de progressão).
A-ROP: evolução rápida e agressiva, progressão em dias, geralmente zona I.
5. Critérios de Tratamento
Indicação absoluta de tratamento (tipo 1):
Zona I: qualquer estágio com plus.
Zona I: estágio 3, mesmo sem plus.
Zona II: estágio 2 ou 3 com plus.
Indicação de observação rigorosa:
Zona I: estágios 1 ou 2 sem plus.
Zona II: estágio 3 sem plus.
Tratamento deve ser realizado em até 72h após indicação (ideal <48h na A-ROP).
6. Manejo e Prescrição
6.1. Prevenção Primária
Oxigenoterapia sempre controlada
Saturação alvo: 90–95% (ajustar para menor valor seguro conforme protocolos institucionais).
Oximetria contínua, alarmes configurados, registros horários.
Ajustar FiO₂ progressivamente, evitando flutuações >5%.
Desmame gradual.
Aleitamento materno preferencial
Contribui para redução de risco.
Garantir aporte nutricional adequado.
Controle de infecções e comorbidades
Prevenção e tratamento precoce de sepse e outras doenças associadas.
6.2. Triagem Oftalmológica
Solicitar consulta oftalmológica para RN conforme critérios.
Preparação do exame: Tropicamida 0,5% e ciclopentolato 0,5%, 1 gota de cada olho, 30–60 min antes do exame. Proparacaína 0,5% antes da fundoscopia.
Manter monitorização cardiorrespiratória durante exame.
6.3. Tratamento Específico (ROP ativa)
1. Fotocoagulação com laser de diodo (810 nm)
Indicação: Critérios de tratamento estabelecidos para ROP tipo 1 e A-ROP.
Realizado em centro especializado, por oftalmologista experiente.
Anestesia tópica ou geral, conforme estabilidade clínica.
Cobrir toda a retina avascular periférica.
Cuidados pós-procedimento:
Analgesia: Paracetamol 10–15 mg/kg/dose VO 6/6h se necessário por 24–48h.
Colírios anti-inflamatórios (Prednisolona 1% – 1 gota 4x/dia por 7 dias) e antibióticos (Tobramicina 0,3% – 1 gota 4x/dia por 5–7 dias).
Monitorização de sinais de complicação: hiperemia conjuntival, secreção ocular, edema palpebral.
2. Injeção intravítrea de anti-VEGF (Bevacizumabe, Ranibizumabe, Aflibercepte)
Indicação: Zona I, A-ROP, falha do laser, impossibilidade técnica (opacidade de meios).
Dose: conforme bula e protocolo institucional (exemplo: Bevacizumabe 0,625 mg/0,025 mL).
Seguimento oftalmológico semanal até vascularização completa ou regressão comprovada.
Atenção para necessidade de acompanhamento prolongado devido risco de reativação.
3. Cirurgia vítreo-retiniana
Indicação: Estágios 4–5 (descolamento parcial ou total da retina).
Realizada exclusivamente em centro terciário.
6.4. Dieta e Cuidados Gerais
Aleitamento materno (preferencial).
Nutrição enteral adequada ao peso e idade.
Monitorar hidratação, crescimento e desenvolvimento.
Prevenir e tratar complicações clínicas associadas: sepse, hemorragias, hemotransfusões apenas se necessário.
6.5. Monitorização e Seguimento
Após tratamento: Revisão oftalmológica em 1 semana, depois a cada 2–4 semanas até regressão comprovada ou vascularização completa.
Seguimento visual prolongado (complicações tardias: miopia, estrabismo, ambliopia, glaucoma, descolamento de retina).
Alta da triagem: Quando vascularização completa (zona III) OU 45 semanas de idade corrigida sem doença ativa.
Seguimento anual até idade escolar.
6.6. Orientações à Enfermagem e Família
Monitorização contínua da oximetria.
Alerta para leucocoria, estrabismo, ausência de fixação visual, ou outros sinais de déficit visual.
Educação quanto ao cronograma e importância da triagem.
Documentar todos os exames e condutas.
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7. Referências Bibliográficas (Norma ABNT)
1. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Prevenção da cegueira infantil causada por retinopatia da prematuridade. São Paulo: SBP, 2019.
2. CHIANG, M. F.; QUINN, G. E.; FIELDER, A. R. et al. International Classification of Retinopathy of Prematurity, Third Edition. Ophthalmology, v. 128, n. 10, p. e51-e68, 2021.
3. ETROP COOPERATIVE GROUP. Revised indications for the treatment of retinopathy of prematurity: results of the early treatment for retinopathy of prematurity randomized trial. Archives of Ophthalmology, v. 121, n. 12, p. 1684-1694, 2003.
4. MINTZ-HITTNER, H. A.; KENNEDY, K. A.; CHUANG, A. Z.; BEAT-ROP COOPERATIVE GROUP. Efficacy of intravitreal bevacizumab for stage 3+ retinopathy of prematurity. New England Journal of Medicine, v. 364, n. 7, p. 603-615, 2011.
5. FIERSON, W. M.; AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS SECTION ON OPHTHALMOLOGY. Screening examination of premature infants for retinopathy of prematurity. Pediatrics, v. 142, n. 6, p. e20183061, 2018.
Tratamento
1. Orientações Gerais ao Prescritor
ROP é doença ocular grave do prematuro, exige triagem, controle rigoroso de oxigenioterapia e tratamento especializado.
Triagem oftalmológica sistemática e documentação obrigatória para todo RN ≤32 semanas OU ≤1500g, além de casos >32sem/>1500g com fatores de risco.
Controle estrito de saturação, prevenção de flutuações (>5%), preferir aleitamento materno, minimizar transfusões e prevenir sepse.
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2. Cuidados Gerais e Prevenção
Oxigenoterapia Controlada
Saturação alvo: 90–95% (individualizar por protocolo local)
Oximetria contínua, alarmes calibrados, registro horário obrigatório.
FiO₂: Usar a menor fração possível; ajustar gradualmente (2-5% de cada vez); evitar hiperóxia.
Desmame gradual.
Aleitamento Materno
Exclusivo sempre que possível.
Aumentar aporte calórico e proteico conforme evolução.
Prevenção de Sepse e Instabilidade Clínica
Lavagem de mãos rigorosa.
Evitar manipulação desnecessária.
Controle rigoroso de sinais vitais.
Prevenção e tratamento precoce de infecções.
Nutrição e Hidratação
Iniciar dieta enteral mínima tão logo permitido (preferencialmente leite materno).
Corrigir distúrbios hidroeletrolíticos conforme necessidade clínica.
Controle rigoroso de peso e balanço hídrico.
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3. Triagem Oftalmológica
Solicitar oftalmologista neonatal para todos RN de risco.
Preparação do exame:
Tropicamida 0,5% + Ciclopentolato 0,5% – 1 gota de cada olho, repetir após 15 min, iniciar 30–60 min antes do exame.
Proparacaína 0,5% – 1 gota por olho imediatamente antes do exame.
Monitorização cardíaca e respiratória durante exame.
Exame inicial: Entre 4–6 semanas de vida ou 31–33 semanas de idade gestacional corrigida (o que ocorrer primeiro).
Seguimento: Conforme achados e zona da doença (vide protocolo SBP/AAP).
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4. Manejo e Prescrição Específica
4.1 Sem Doença ou ROP Leve (Estágio 1–2 Sem Plus)
Acompanhamento ambulatorial: Revisão semanal a cada 1–2 semanas até vascularização completa ou alta da triagem.
Documentação do exame em prontuário.
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4.2 Indicação de Tratamento Específico (Critérios Tipo 1 ou A-ROP)
Tratamento de primeira linha:
Fotocoagulação com laser de diodo (810 nm)
Indicação: ROP tipo 1/A-ROP.
Preparação:
Jejum 4–6h (se anestesia geral).
Garantir acesso venoso seguro.
Consentimento informado da família.
Monitorização multiparamétrica.
Execução: Realizada por oftalmologista experiente em centro habilitado.
Cuidados Pós-Procedimento:
Monitorização intensiva por 2–4h após laser.
Paracetamol 10–15 mg/kg/dose VO a cada 6h, por 24–48h (analgesia, se necessário).
Colírio prednisolona 1%: 1 gota 4x/dia por 7 dias (anti-inflamatório local).
Colírio tobramicina 0,3%: 1 gota 4x/dia por 5 dias (profilaxia antibiótica).
Orientar família sobre sinais de alerta: hiperemia ocular, secreção, queda importante do estado geral.
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Tratamento alternativo ou adjuvante:
Anti-VEGF intravítreo (Bevacizumabe, Ranibizumabe, Aflibercepte)
Indicação: Zona I/A-ROP, falha ou impossibilidade do laser, opacidade de meios.
Dose Bevacizumabe: 0,625 mg/0,025 mL em cada olho (dose padrão institucional).
Administração: Em centro habilitado, por oftalmologista treinado.
Pós-procedimento: Observação hospitalar por 1–2h, seguimento semanal com fundoscopia até vascularização completa.
Atenção: Maior risco de reativação tardia (seguimento prolongado obrigatório).
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4.3 Casos Graves (Estágio 4 ou 5 – Descolamento de Retina)
Encaminhamento urgente para centro terciário de referência em cirurgia vítreo-retiniana pediátrica.
Cirurgia via pars plana (vitrectomia, retinopexia, remoção de membranas) conforme avaliação do especialista.
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5. Cuidados Pós-Tratamento e Seguimento
Revisão oftalmológica em 1 semana após laser/anti-VEGF.
Seguimento conforme gravidade:
ROP zona I ou A-ROP: semanal até vascularização completa.
ROP zonas II e III: 1–2 semanas.
Alta da triagem: após vascularização completa OU 45 semanas de idade corrigida sem doença ativa.
Seguimento anual com avaliação visual, refração, rastreio de complicações tardias (miopia, estrabismo, ambliopia, glaucoma, descolamento tardio).
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6. Outras Medidas e Precauções
Contraindicações e precauções:
Colírios midriáticos: Usar dose mínima; monitorar sinais de toxicidade sistêmica.
Anestesia geral: Precaução em prematuros instáveis; monitorização intensiva.
Oxigenoterapia: Evitar hiperóxia e hipoxemia. Ajuste progressivo.
Educação da família:
Explicar cronograma de exames, importância do seguimento e sinais de alerta visual.
Orientar sobre necessidade de seguimento visual prolongado, mesmo após regressão da doença.
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7. Recursos e Equipe
Oftalmologista pediátrico com experiência em ROP.
Neonatologista, anestesista e enfermagem especializada.
Equipamentos: Oftalmoscópio indireto, laser diodo, monitor multiparamétrico.
Registro e documentação rigorosos.
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8. Resumo das Doses (Tabela)
| Medicação | Dose | Via/Frequência | Indicação |
| -------------------------- | ------------------------------------------ | --------------------------- | --------------------------------- |
| Tropicamida 0,5% | 1 gota cada olho, repetir 15min se preciso | Tópica, 30–60 min pré-exame | Midríase para exame oftalmológico |
| Ciclopentolato 0,5% | 1 gota cada olho | Tópica, 30–60 min pré-exame | Midríase e cicloplegia |
| Proparacaína 0,5% | 1 gota cada olho | Tópica, imediatamente antes | Anestesia tópica ocular |
| Paracetamol (gotas) | 10–15 mg/kg/dose VO | 6/6h, 24–48h | Analgesia pós-procedimento |
| Prednisolona 1% (colírio) | 1 gota | 4x/dia por 7 dias | Anti-inflamatório ocular local |
| Tobramicina 0,3% (colírio) | 1 gota | 4x/dia por 5 dias | Profilaxia antibiótica local |
| Bevacizumabe (anti-VEGF) | 0,625 mg/0,025 mL | Intravítreo, dose única | ROP zona I/A-ROP |
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